Archive for September, 2010
O primeiro político eleito por Paranavaí
Otacílio Egger representou Paranavaí na Câmara Municipal de Mandaguari
O pioneiro Otacílio Egger foi o primeiro político eleito por Paranavaí, no Noroeste do Paraná. Em dezembro de 1947, assumiu o cargo de vereador de Mandaguari, município do qual Paranavaí era distrito.
A campanha de Otacílio Egger, do Partido Social Democrata (PSD), foi baseada na popularidade e na idoneidade. O candidato era famoso por socorrer a população nos momentos mais difíceis. Nas eleições de 1947, para a escolha de prefeito e vereadores de Mandaguari, Paranavaí participou com 383 eleitores. Do total, muitos votaram em Otacílio Egger para vereador e Décio Medeiros Pullin para prefeito.
Segundo o pioneiro Ulisses Faria Bandeira, foi a primeira campanha política da comunidade, e a luta era contra o progresso de Maringá que tinha o apoio da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) que lançou a candidatura de Valdemar Cunha Gomes, conhecido como Barbudo. “Décio Pullin se elegeu e o nosso candidato Otacílio Egger também”, relatou Bandeira em entrevista ao jornalista Saul Bogoni décadas atrás.
Egger assumiu uma vaga na Câmara Municipal de Mandaguari em 13 de dezembro de 1947, cargo que ocupou até 10 de dezembro de 1951. A pioneira fluminense Palmira Egger, casada com Otacilio, contou em entrevista publicada no livro “História de Paranavaí”, de Paulo Marcelo, que o marido fez muito pela cidade.
“Quando aqui era nada, ficava ele e o Paulo Tereziano de Barros até de madrugada fazendo abaixo-assinado para mandar pra Curitiba. Pediam que viessem a Paranavaí abrir estradas e fazer pontes”, disse. Otacilio Egger foi uma das pessoas que mais lutou pelo desenvolvimento local até a década de 1970. No entanto, não foi devidamente reconhecido, tanto que é muito difícil encontrar pessoas que já tenham ouvido falar do pioneiro.
Como vereador, Egger viajava para Mandaguari duas vezes por semana, deixando Palmira com os dois filhos. “Não era fácil lidar com aquelas pessoas mal-encaradas. Todo dia tinha gente procurando meu marido e pedindo para legalizar chácaras, estradas, lotes e pontes”, desabafou a pioneira fluminense.
O pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, afirmou que Otacílio e Palmira eram as pessoas mais simpáticas da colônia. “Eram muito bons. O compadre Otacílio Egger sempre defendeu os nossos direitos. Uma vez até fizemos uma serenata pro Otacílio e pra Palmira em agradecimento”, frisou Palhacinho.
Egger foi o responsável por enviar ao prefeito de Mandaguari, Décio Pullin, um pedido para que formalizasse o nome do distrito como Paranavaí. Entre os moradores da colônia nos anos 1940 e 1950, há unanimidade em apontar Otacilio Egger como uma das autoridades mais importantes da história local.
Paranavaí parecia um cemitério
Os pioneiros Otacílio e Palmira Egger, acompanhados de dois filhos e uma empregada, deixaram o Estado do Rio de Janeiro e vieram para Paranavaí em 10 de março de 1945, quando conversaram com o pioneiro Rodrigo Ayres de Oliveira. “A fama da Fazenda Velha Brasileira [atual Paranavaí] não era nada boa. Os que estiveram aqui antes da gente fizeram muitos absurdos”, declarou Palmira.
A colônia parecia um cemitério quando os Egger fixaram residência no povoado. Não havia energia elétrica e ao anoitecer a escuridão tomava conta de tudo. “O local era horrível, só tinha gente atrasada e necessitada. Não existia, carne, pão e leite. Só melhorou depois de 1956”, assinalou Palmira. A realidade era tão difícil que a pioneira afirmou que nunca esperou que Paranavaí se tornasse o que é hoje.
“Quando chegamos aqui devia ter umas vinte casas e as ruas já estavam traçadas. Trouxemos cem mil contos de réis em mercadoria pra abrir uma casa de secos e molhados. Em seguida, compramos uma área de 96 alqueires em Paraíso do Norte e abrimos uma fazendinha”, assinalou Palmira. Naquele tempo, o comércio se resumia as casas comerciais dos pioneiros Carlos Faber, Leodegário Gomes Patriota e Joaquim Machado.
Alcides de Sordi também concorreu as eleições de 1947
O jovem Alcides de Sordi, presidente do diretório local da União Democrática Nacional (UDN), também concorreu ao cargo de vereador da Câmara Municipal de Mandaguari, assim como Otacílio Egger, nas eleições de 1947. Alcides fez oposição ao Partido Social Democrata (PSD), liderado pelo capitão Telmo Ribeiro, mas não obteve votos e nem apoio suficientes para ser eleito.
Saiba Mais
Otacílio Egger foi eleito vereador na primeira eleição municipal de Mandaguari.
O pioneiro nasceu em 16 de abril de 1911, em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, e morreu em 31 de julho de 1974 em Paranavaí.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
A opressão na mata
Empreiteiro escravizava peões que trabalhavam na derrubada de mata
Nos anos 1940, muitos pioneiros de Paranavaí atuaram na abertura de estradas no Novo Norte do Paraná. Em algumas situações, as condições de trabalho eram tão precárias que os trabalhadores passavam fome e até morriam.
O que a população de Paranavaí desconhece até hoje é que muitas das vias que ligam a cidade a outros municípios, criadas há mais de 60 anos, tiveram um preço bem alto. Custaram dezenas de vidas de trabalhadores.
Na década de 1940, não havia nenhum tipo de fiscalização na abertura de estradas, assim permitindo que alguns empreiteiros do Governo do Paraná explorassem ao máximo os peões. Naquele tempo, a jornada de trabalho ultrapassava 16 horas diárias.
Quem viveu a dura realidade de trabalhar na mata, ajudando a abrir novas vias, foi o mineiro Arlindo Francisco Borges. O pioneiro passou por experiências surpreendentes em 1946, quando a Colônia Paranavaí se resumia a um “matagal mal fechado”, conforme palavras de Borges.
Naquele ano, Arlindo Francisco, que sonhava com um futuro melhor, chegou a colônia em uma jardineira da Viação Garcia que fazia a linha Londrina-Paranavaí. Logo conseguiu um serviço como peão. O trabalho na derrubada de mata era pesado e rendia 500 réis por alqueire, valor que era pago pelo Governo do Paraná. A primeira via aberta pelo pioneiro foi a Rua Paraíba, começando pelo antigo Terminal Rodoviário e indo até o antigo Cemitério Municipal, na região central.
“Abri também a Rua Acre, entre a Rua Bahia, perto da Santa Casa de Paranavaí, e Rua Mato Grosso. Meu irmão, um sobrinho e um amigo trabalhavam comigo”, relatou Arlindo Borges em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás. À época, um dos responsáveis por coordenar o trabalho de abertura de estradas era o Capitão Telmo Ribeiro.
“A área que ele cuidava ia desde o Surucuá até o Jardim São Jorge”, disse. Em Paranavaí, quem executava e acompanhava as obras era o empreiteiro Zeca Machado que trabalhava para o Governo do Paraná. Borges e Machado tiveram uma boa relação de trabalho.
Além de criar novas ruas e avenidas em Paranavaí, o mineiro trabalhou muito tempo fora do povoado. Primeiro, ajudou a abrir uma estrada que ligou Paranavaí a Capelinha, atual Nova Esperança. “Também atuei na abertura de uma via daqui até o Porto São José”, declarou.
Quando estava abrindo uma estrada que ligava Maringá a Campo Mourão, Arlindo Borges viveu o pior momento da vida como peão. O empreiteiro da obra, de quem não citou o nome, não prestou nenhum tipo de assistência aos trabalhadores, muito pelo contrário, os tratou com um desrespeito e despotismo que beirou às raias da escravidão.
“Ele se recusou a dar comida pra gente, nos deixou com fome durante o tempo em que trabalhamos lá. Um dia, não estávamos aguentando mais, daí eu e mais cinco decidimos voltar pra Paranavaí”, revelou Borges, acrescentando que na região havia mais empreiteiros com a mesma índole.
Cinco dias sem comer nada
O caminho longo e tortuoso foi percorrido a pé pelos peões que há cinco dias não comiam nada. “A gente não tinha mais forças. Tivemos que posar no mato duas noites durante a volta, até chegar a sede da colônia. No caminho, viemos comendo banana que a gente encontrava na mata. Foi assim que conseguimos chegar aqui”, assinalou e ressaltou que se dependessem do contratante teriam morrido.
O fato mais alarmante narrado pelo pioneiro é que durante o trajeto encontraram muitas pessoas em situação semelhante. Havia um grande número de peões trabalhando em áreas próximas e muitos já estavam exauridos e doentes. Arlindo Francisco lembrou que os maus-tratos eram freqüentes e se a pessoa adoecesse era deixada para trás.
Nos casos em que os trabalhadores morreram, o empreiteiro apenas interrompeu o serviço, reuniu alguns peões e os enterrou na mata mesmo. O episódio se repetiu dezenas de vezes. Segundo Borges, o encarregado das obras nunca se preocupou em avisar a família do falecido ou em levar o corpo para a colônia. “Ele oprimia demais a gente e isso acabou só quando ele morreu”, desabafou.
Saiba Mais
Muitos peões foram esmagados por toras de árvores durante a derrubada de mata nos anos 1930, 1940 e 1950.
Frases dos pioneiros
João da Silva Franco
“Aqui nós fizemos ruas e estradas a braço porque não havia máquinas. Abrimos daqui a Nova Aliança do Ivaí [antiga Derrubada Grande e depois Guaritá], do finado João Pires, e também Amaporã que naquele tempo era Jurema.”
“Quando os peões se juntavam, rodava a pinga.”
Raimundo Leite
“Gustavo Marques, Lázaro Vieira, Antonio Foicim, Pedro Barizon e o Diamante também faziam a abertura das matas.”
Frutuoso Joaquim de Salles
“Em 1929, a Brasileira já estava instalada e o pessoal vinha aqui derrubar mato.”
José Ferreira de Araújo (Palhacinho)
“Tinha os coitados que trabalhavam no mato, no meio da mosquitada. No dia que vinham para a cidade traziam um dinheirinho e enchiam a cara.”
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
Primeira igreja de Paranavaí foi construída em 1944
A primeira celebração foi realizada em alemão com colonos de Graciosa
Em 1944, o padre João Guerra reuniu pioneiros para a construção da primeira igreja de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. O local é o mesmo que abriga hoje a Paróquia São Sebastião. Lá, a primeira missa foi celebrada no dia 25 de dezembro.
De acordo com informações do livro “História e Memória de Paranavaí”, escrito pelo falecido frei alemão Ulrico Goevert, e publicado em 1992, o primeiro padre a visitar a Fazenda Brasileira, atual Paranavaí, foi o alemão Carlos Propst, da Congregação dos Padres Palotinos, que realizou uma cerimônia em frente à Inspetoria de Terras. No local, foram crismadas pelo menos cinquenta pessoas. À época, a Paróquia de Mandaguari, no Norte Central do Paraná, a quem a colônia pertencia, mandava padres três ou quatro vezes ao ano para realizar missas, batizados e casamentos a céu aberto.
Após iniciada a colonização, somente depois de 18 anos, em 27 de setembro de 1944, a paróquia enviou um sacerdote para residir no povoado. “O padre João Guerra veio interessado em abrir uma chácara. Falou que precisava montar uma igreja porque tinha muita gente vindo pra cá”, afirmou o pioneiro paulista Salatiel Loureiro em entrevista à Prefeitura de Paranavaí nos anos 1970.
Naquele tempo, o primeiro símbolo religioso da colônia, uma grande cruz de madeira, foi fixado onde se situa o velho Terminal Rodoviário. “Acharam o local impróprio e mudaram a cruz para um lugar mais acima. Lá, a Inspetoria de Terras doou uma quadra de 110 por 120 metros para a criação da igreja”, contou o frei alemão Ulrico Goevert.
A madeira usada na construção foi doada pelo marceneiro José Ebiner. Já as outras despesas foram custeadas com dinheiro arrecadado pelo administrador da colônia, o pioneiro curitibano Hugo Doubek. “O padre pediu para o Hugo cobrar uma rendazinha dos negócios de terras realizados aqui. Ele concordou”, revelou Loureiro.
Pioneiros como Paulo Tereziano de Barros, Nenê, Salatiel Loureiro, João da Silva Franco, José Vicente da Costa, Joaquim Machado e Zé Bicudo foram os responsáveis pelo sucesso da obra. “Lembro que no altar mal cabia o padre e dois santos”, comentou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à prefeitura na década de 1970.
A primeira missa na igrejinha de madeira foi realizada no Natal de 1944 pelo padre João Guerra. “Foi uma celebração cantada em alemão pelos colonos de Graciosa, distrito de Paranavaí”, frisou o frei Ulrico. Naquele dia, durante o rito, uma cobra venenosa invadiu a igreja e se enrolou no braço de um dos fiéis. Enquanto a população gritava, o homem se manteve imóvel até que a peçonhenta foi embora sem picar ninguém.
A primeira igreja serviu também de sala e quarto para o padre João Guerra que viveu em Paranavaí até o final de 1945. De acordo com pioneiros, o sacerdote contribuiu muito com a comunidade, mesmo tendo ficado pouco tempo no povoado. O administrador da colônia Hugo Doubek, que era de religião protestante, teve alguns conflitos com João Guerra por causa de cobranças de recursos para investir na criação de uma paróquia.
“O Hugo decidiu não pegar mais dinheiro da população para repassar à igreja porque ele achava errado. Deu um rolo e quiseram até tirar o padre daqui. O Capitão Telmo Ribeiro entrou no meio e apaziguou tudo”, revelou Loureiro. Mais tarde, houve uma tentativa de envolver o padre na política local, o que o motivou a deixar a colônia.
Saiba Mais
O padre João Guerra comandou a administração da colônia por uma semana em 1945, quando o administrador Hugo Doubek foi embora.
Frases dos pioneiros sobre o padre João Guerra
João da Silva Franco
“O padre trabalhava numa chácara que ele abriu. Lá, construiu uma represa e um moinho de fubá pro povo.”
“Aos sábados, o padre João Guerra vinha pra cá, trocava as roupas e se preparava pra fazer a missa de domingo.”
As ruas de cascas de peroba
As primeiras vias de Paranavaí foram pavimentadas com restos de madeira
Na década de 1940, quando as vias de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, eram compostas por faixas de areia, os pioneiros usaram cascas de peroba como alternativa de pavimentação para o tráfego de veículos.
O marceneiro José Ebiner é o pioneiro da pavimentação em Paranavaí. Na época em que a colônia era chamada de Fazenda Brasileira, teve a ideia de cobrir as vias, que se resumiam a faixas de solo arenoso batido, com cascas de peroba. “A Velha Brasileira era puro areião. Então o Zé Ebiner inventou o calçamento. Isso não começou com os nossos prefeitos não. Foi com a gente usando cascas de madeira”, afirmou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
O marceneiro tomou a iniciativa de cobrir o solo arenoso da Avenida Paraná e da Rua Getúlio Vargas com os muitos restos de madeira que sobravam na serraria. “O Zé Ebiner foi um dos primeiros pioneiros. Quando cheguei aqui a primeira coisa que fiz foi comprar madeira dele”, relatou Palhacinho. O pioneiro paraibano Cincinato Cassiano Silva faz coro às palavras de José Ferreira. “A primeira serraria privada de Paranavaí foi do Ebiner”, comentou.
Pioneiros lembram que a comunidade se uniu para transportar as cascas de peroba e esparramá-las pelas vias da Brasileira. “Era só jogar nas ruas que já dava um pavimento bom pra passar um pé-de-bode”, declarou José Ferreira. Os restos de madeira proporcionavam mais firmeza as vias e também beneficiavam os pedestres.
Em dias de Sol, os transeuntes podiam caminhar sobre as cascas para evitar sujar os calçados. Já quando chovia, o pavimento improvisado permitia que escapassem da lama. “A ideia do Ebiner ajudou muito a gente”, enfatizou Araújo, acrescentando que é impossível falar de madeira nos tempos da colonização sem citar o marceneiro.
O pioneiro paulista Valdomiro Carvalho prestou muitos serviços a José Ebiner. Carregou um grande número de toras de árvores que serviram para a construção de residências, casas comerciais e pavimentação. “Eu puxava tudo com um carretão de bois. Ia lá pra mata bruta derrubar figueiras, perobas, paus d’alho e palmitos. Quase todos os tipos de madeira”, complementou Carvalho.
Ebiner ajudou a construir o estádio e o Grupo Escolar
De acordo com o pioneiro paulista Natal Francisco, Ebiner contribuiu na criação do primeiro estádio de Paranavaí, onde é atualmente a Praça dos Pioneiros. “Ele me ajudou muito. Cobrou pouco pela mão-de-obra e pela madeira”, destacou. O marceneiro também teve participação importante na viabilização do primeiro hospital local.
“O Zé Ebiner deu madeira para construir o Hospital do Estado e também o Grupo Escolar [primeira escola de Paranavaí, onde se situa hoje o Colégio Estadual Marins Alves de Camargo]”, revelou o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira. Parte da madeira aproveitada pelo marceneiro, que também forneceu matéria-prima para a construção da primeira igreja, pertenceu a Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco) nos tempos em que Paranavaí era conhecida como Distrito de Montoya.
O pioneiro José Ferreira desabafou que nos anos 1940 a vida na colônia era muito difícil. O povoado era praticamente ignorado pelo Governo do Paraná. “A gente teve que fazer muitos sacrifícios como esse da pavimentação. Vivíamos no completo abandono, autoridades estaduais nunca vinham pra cá confortar o povo. Éramos obrigados a decidir tudo. O que valia era a palavra de cada um que vivia aqui”, reclamou.
Só a partir de 1946, a Colônia Paranavaí ganhou outras serrarias. Um homem conhecido como “Seu Pombalino” abriu uma na Avenida Distrito Federal, próxima ao Posto São José. Era pequena, mas também ajudou bastante. “Depois veio a marcenaria do Otto”, ressaltou Cincinato Cassiano.
O aliendígena
Plebeu: “Todo mundo dizia que eu tinha criado um estilo, mas não me deram incentivo algum”
Há mais de vinte anos, Roldney Plebeu, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, encontrou na arte mais do que um hobby e uma profissão: uma razão existencial. Cada uma de suas telas recebe cores e formas que nascem da mistura de impressões e sentimentos. É a arte existencialista de um aliendígena, como o artista define a si e tudo que produz.
Roldney Plebeu, 42, teve o primeiro contato com o desenho e a pintura na infância. “Comecei rabiscando com caneta”, diz. Na adolescência, se tornou um artista autodidata solitário por causa da incompreensão e falta de apoio. Aos 23 anos, sentiu necessidade de amadurecimento artístico e tentou entender melhor as próprias pinturas. Anos depois, insatisfeito em Paranavaí, Roldney se mudou para São Paulo.
Na capital paulista, o artista conheceu alguns empórios, institutos e escolas de artes como a Panamericana Escola de Arte e Design. “Precisava saber se o meu trabalho pertencia a alguma corrente artística, mas apenas me decepcionei. Todo mundo dizia que eu tinha criado um estilo, que sou revolucionário da arte, mas não me deram incentivo algum”, lamenta, sem esconder a decepção.
Plebeu não conseguiu custear as despesas em São Paulo por muito tempo e logo adotou como lar um banco gelado do Terminal Rodoviário da Barra Funda, espaço que dividia com mendigos. “Eu dormia pouco nessa época. Ficava a maior parte do tempo pintando na Avenida Paulista”, relata. O destino era sempre uma viela do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp).
Lá, chamou a atenção de estrangeiros. Turistas dos Estados Unidos, Japão, Inglaterra e Israel compraram muitas de suas obras. “Um norte-americano, Joshua Rodriguez, presidente de uma fábrica de medicamentos do Texas, gostou muito do meu trabalho. Comprou até pinturas inacabadas”, garante Roldney. Convidado a se mudar para Londres, recusou a proposta para não se distanciar da mulher e dos filhos que estavam em Paranavaí.
Não demorou para os seguranças do Masp pedirem para Plebeu procurar outro lugar para pintar. Sem lugar fixo para expor as obras, o artista teve dificuldade em vender o que produzia. “Comecei a dar aula de graça para crianças de rua que eram viciadas em drogas”, explica. Pouco tempo depois, a desvalorização artística levou Roldney à depressão crônica. “Diziam que minhas obras eram complexas demais. Não consegui vender mais quase nada. Me envolvi com pichação e comecei a usar drogas”, revela o artista que abandonou a dependência química quatro anos depois e retornou a Paranavaí.
Emocionado, declara que nunca conquistou estabilidade trabalhando com arte, inclusive há períodos em que enfrenta sérias dificuldades para comprar materiais. “Pintar é uma terapia, mas é uma pena que com essa arte eu não consiga manter a mim e minha família”, desabafa o pintor que também é escultor. Plebeu manipula madeira, pedra-sabão e ferro.
O conceito aliendígena
Roldney Plebeu é um artista prolífico. Consegue produzir pelo menos 15 obras por mês. Pinta telas com extrema naturalidade, tanto que abre mão de criar esboços. “Muito do que pinto surge como uma surpresa até pra mim, é algo sem planejamento, um reflexo da maneira como eu encaro o mundo e a vida”, justifica Plebeu que materializa impressões e emoções usando pincel e tinta.
O artista é autor do estilo aliendígena de conceber arte. O neologismo é uma referência às origens de Roldney Plebeu, um sincretismo de europeu e índio. “Eu sou o aliendígena, uma mistura de etnias. Trato das diferenças em meio ao caos mundial. Cada pessoa pode interpretar como quiser”, comenta.
O conceito estético aliendígena parece carregar um pouco de brasilidade, tropicalismo, existencialismo, surrealismo e modernismo; uma arte de origem globalizada e destribalizada que aborda a heterogeneidade cultural do ser humano e descortina as dificuldades do homem em reconhecer a si mesmo diante do semelhante. É possível encarar cada pintura de Plebeu como um quebra-cabeças, tanto na forma quanto no conteúdo, inclusive os personagens do quadro são fragmentos que se encaixam tanto quanto se antagonizam.
Roldney Plebeu também trabalha com paisagismo. É uma maneira de dar novas perspectivas a um ambiente. “É como criar um mundo dentro de outro”, avalia o artista plástico que também é poeta, letrista e escreve até versos de rodeio.
Frase do artista plástico Roldney Plebeu sobre a arte aliendígena
“Em São Paulo, quando era mais jovem, mostrei meus quadros para pessoas com grande formação em arte. Achei que me dariam respostas, mas me enganei.”
Contato
Para mais informações sobre o trabalho de Roldney Plebeu, basta ligar para (44) 9832-3901
A fome que chegou com a chuva
População de Paranavaí passou fome durante longos períodos de chuva
Na década de 1940, quando chuvas torrenciais atingiam Paranavaí, no Noroeste do Paraná, por longos períodos, era difícil e até perigoso deixar o povoado. Nessas circunstâncias, a população era obrigada a lidar com a fome enquanto esperava o fim da chuva.
Uma das situações mais críticas vividas pelos pioneiros foi registrada em 1945, quando 16 dias de chuva castigaram a colônia. Ninguém imaginava que choveria tanto numa época em que não se tinha o hábito de manter uma despensa, nem mesmo para casos emergenciais.
Antes da chuva chegar ao fim, ninguém mais no povoado tinha o que comer em casa. E para piorar, era impossível deixar Paranavaí e buscar alimentos nas cidades ao Sul do estado. Além de não haver meios de transporte que aguentassem longas viagens, trafegar com veículos pequenos pelas íngremes estradas de chão era algo impensável. Além disso, o fato das vias serem estreitas e ladeadas pela mata só aumentava os riscos.
“Já era 1h da madrugada quando ouvimos o ronco de um caminhão. Foi uma surpresa pra todo mundo. Ninguém mais vinha pra cá fazia 16 dias, tanto que a gente estava sem nada. A comida já tinha até acabado”, lembrou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
O som do caminhão na Rua Getúlio Vargas, no cruzamento com a Rua Marechal Cândido Rondon, fez todo mundo levantar da cama, acender os lampiões e correr para o centro da colônia. Quando chegaram lá e viram os faróis acesos, o empreiteiro Zeca Machado desceu do veículo e mostrou para a população toda a comida trazida de Curitiba. Além de mantimentos, Machado trouxe muitas verduras e legumes para abastecer Paranavaí.
“Todo mundo comprou tudo. Naquele tempo, era normal um dever para o outro porque a gente tinha o costume de emprestar açúcar, café e dali em diante”, destacou José Ferreira. Zeca Machado era o empreiteiro da Colônia Paranavaí e conhecia todas as estradas da região, até porque muitas foram abertas por ele.
Machado viajava esporadicamente a Curitiba com um caminhão do Governo do Paraná para buscar alimentos, materiais de construção e outros produtos. “Mais tarde, o Zeca Machado abriu um armazém e começou a fornecer tudo que a população precisava”, destacou Palhacinho.
O pioneiro paulista Salatiel Loureiro afirmou que o empreiteiro foi o primeiro comerciante da colônia. “O Zeca começou com tudo, depois veio o Patriota, o Lindolfo e o Carlos Faber”, revelou.
Palhacinho dava carne de anta para a freguesia
Quem também ajudou a população em um longo período de chuvas foi o pioneiro Rodrigo Ayres que certa vez viajou até Marialva, no Norte Central Paranaense, para buscar uma carroça de mantimentos.
“A viagem durou 15 dias. Demos o dinheiro e ele trouxe tudo que pedimos. Pouco tempo depois, o Patriota [Leodegário Gomes Patriota] abriu um armazém e logo tivemos fartura. Nunca mais faltou comida”, relatou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho.
Ainda nos anos 1940, Araújo tinha uma pensão em Paranavaí e alimentava os clientes com carne de anta. “Eu mesmo que caçava lá na Água da Floresta e Tucano. Cozinhei muitas paneladas para dar ao pessoal. Depois melhorou e pude alimentar eles com carne seca e batata. Todo mundo comia contente. Ninguém saía daqui com fome”, declarou.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
Os torneios de luta livre do Seu Ferreira
Seu Ferreira era o destaque de Paranavaí quando o assunto era entretenimento
No final dos anos 1940 e na década de 1950, um homem conhecido como Seu Ferreira era o destaque de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, quando o assunto era entretenimento. Numa época em que havia poucas opções de lazer, o pioneiro surpreendeu todo mundo ao realizar torneios de luta livre com alguns dos praticantes mais célebres do Paraná e do Brasil.
Até 1945, Paranavaí ainda era um povoado isolado. Em dias de sol, aparecia um ônibus por dia na Colônia. E quando chovia, não chegava ninguém. Naquele tempo, era difícil não se incomodar com a monotonia, pois diversão era algo que não fazia parte do cotidiano da população. “Isso mudou quando apareceu o Seu Ferreira, um homem de idade avançada. Era ele quem animava o lugar. Que divertia a gente”, contou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
O homem, chamado por todo mundo de Seu Ferreira, era o maior símbolo de alegria e diversão de Paranavaí. Logo que chegou ao povoado, percebeu que a vida da maioria se limitava ao trabalho. Então tomou a decisão de fazer a diferença. Ferreira viajou sozinho até Curitiba e de lá trouxe alguns dos mais célebres nomes da luta livre, como Cabeludo, Tarzan, Taturana e mais outros que lutaram também fora do Brasil.
As primeiras lutas foram realizadas na região central, onde mais tarde surgiu a Livraria Santa Helena, na Avenida Paraná. Lá, Ferreira estendia um tapete de 12 metros de comprimento por 12 metros de largura, mas o confronto ocorria em um espaço de sete metros.
Quem ultrapassasse o limite permitido para o duelo perdia pontos, e o acúmulo de punições podia resultar na vitória do adversário. Pioneiros lembram que sempre venciam as lutas quem dava os melhores golpes e conseguia segurar o adversário no chão por dez segundos. O ideal era imobilizar e manter o ombro do oponente contra a lona.
Golpes baixos faziam parte do show, embora fossem reprovados. Era uma forma de despertar mais a atenção do público. Joelhadas, cotoveladas, puxadas de cabelo e de orelha, golpes nas genitais, pescoço e pé estavam entre as ações que custavam pontos ao lutador. Os torneios eram tão divertidos que até mesmo quem não gostava de luta não hesitava em assistir. “De noite, todo mundo ia pra lá. Todo mundo mesmo. A gente saía mais cedo de casa e assistia tudo”, relatou o pioneiro José Araújo.
Outro costume da época era o de reunir bandos e ir a até a área onde surgiu o Sumaré, distrito de Paranavaí, para buscar jabuticaba. “A gente saía daqui com latas de querosene. Era o nosso passatempo quando aqui não existia piscina e nem clube”, salientou Palhacinho. Quem também ofereceu diversão a população foi o pioneiro João Carraro, um dos poucos que tinha rádio na colônia. Muita gente ia todas as noites até a casa do pioneiro para acompanhar a programação da Rádio Nacional. “Ali a gente passava a noite, conversava e ria muito”, revelou José Ferreira.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
O gado dormia no centro de Paranavaí
Bois e vacas passavam a noite nas ruas mais movimentadas da cidade
Entre os anos de 1940 e 1950, era muito comum encontrar mais animais do que pessoas circulando à noite por Paranavaí, no Noroeste Paranaense. O gado tomava conta das ruas de maior tráfego, onde aproveitava para descansar e dormir até o dia amanhecer.
Na década de 1940, a população de Paranavaí começou a perceber um comportamento incomum. Com a chegada da noite, os bovinos abandonavam as propriedades e iam até o centro da cidade. Lá, deitavam e dormiam sem se preocupar com a presença de transeuntes. O que facilitava a movimentação do gado era o fato de serem criados soltos. “Não tinha mangueira, nem nada pra cercar naquele tempo”, contou o pioneiro José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
Como ainda não havia iluminação nas ruas, os moradores só saíam à noite com lanterna farolete ou lampião para não trombarem com os animais. “Pra piorar, tinha um fumaceiro danado que começava na Inspetoria de Terras e ia até onde é hoje a Praça dos Pioneiros. Isso acontecia porque havia muitos cipós na cidade e o pessoal colocava fogo em tudo”, lembrou Palhacinho que durante a colonização encontrou muitos bois, vacas e cavalos deitados nas ruas. A Avenida Paraná, a via mais importante de Paranavaí na época, era a preferida dos animais.
Com o tempo, o gado se espalhou pela cidade. Quando o Cine Theatro Paramounth foi inaugurado em 1948, os animais já tinham o hábito de dormir na Rua Marechal Cândido Rondon, nas imediações da Banca do Wiegando. “Ficava cheio de vacas deitadas. Já estavam acostumadas. O gado fazia as sujeiras e a gente estava sempre sujeito a pisar em cima”, relatou Araújo, acrescentando que os animais ficavam no centro até o dia amanhecer.
Houve casos também em que o gado invadiu propriedades. Ninguém tinha o costume de murar ou cercar as casas. Os animais eram tranquilos, mas surpreendiam ao serem vistos no interior de cozinhas e salas das residências dos pioneiros. As invasões aconteciam quando estavam com fome.
Paranavaí começou a crescer em 1946
Paranavaí começou a se desenvolver a partir de 1946, graças a chegada de muitos migrantes que ouviam falar muito bem a respeito do povoado. Com o crescimento populacional, o comércio também se expandiu. “Construímos uma capela e fizemos as primeiras festinhas. Em 1947, o Ulisses Faria Bandeira [agrimensor e ex-prefeito de Paranavaí] fez a primeira pavimentação de uma rua, lá em frente a Praça dos Pioneiros”, contou Palhacinho, pioneiro que buscava cascalho e areia no Porto Mirador.
Naquele ano, chegou tanta gente em Paranavaí que “parecia a corrida do ouro”, segundo o pioneiro mineiro José Antonio Gonçalves. Para acomodar os migrantes e imigrantes foi construído um grande albergue perto da Praça da Xícara. “Todo mundo era acolhido lá”, enfatizou.
Ainda em 1947, o Governo do Paraná parou de conceder terrenos para a construção de moradias na região central. O objetivo era fomentar o comércio, destinando lotes na área somente a quem tivesse intenção de abrir um negócio. “Ainda tinha muitas estradinhas e ranchos esparramados por Paranavaí. A ideia era organizar isso tudo. Não esqueço que o Ulisses foi o responsável por cortar as ruas”, declarou.
O Tabuinha Alto e o Tabuinha Baixo
Um fato que hoje chama atenção, mas era muito comum no final dos anos 1940, era o costume dos migrantes de encostarem tábuas nas residências. “O povo que chegava em Paranavaí fazia isso e dormia embaixo das tabuinhas pro lado de fora da casa. Foi assim, no alvoroço, que o povo começou a construir para um lado e para o outro”, revelou Araújo.
Quando todas as casas de Paranavaí eram construídas com tábuas, dois rapazes ganharam destaque. Eram os responsáveis pelo transporte de quase toda a madeira usada na construção das residências. “Conhecidos como Tabuinha Alto e Tabuinha Baixo, eles quem cortavam a madeira e faziam as tabuinhas. Também desmontavam de um lugar para levar pra outro”, salientou Palhacinho.
Tabuinha Alto e Tabuinha Baixo fizeram sucesso quando havia poucos veículos em Paranavaí. Quase todo mundo comprava madeira da dupla. “Graças a eles, logo tivemos um monte de casinhas em Paranavaí”, comentou.
Frase da pioneira Ana Maria Estrada
“A casa era rodeada de mato e as vacas dormiam na porta do armazém.”
O alto-falante do Palhacinho
José Ferreira de Araújo foi o primeiro publicitário de Paranavaí
Nos anos 1940, quando surgiram os primeiros pontos comerciais de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, decidiu investir em publicidade. Com um serviço de alto-falante, fez desde as mais simples até as mais inusitadas divulgações.
José Ferreira chegou a Paranavaí na época da Fazenda Brasileira, em 1944. Se surpreendeu com o que viu; um pequeno deserto no meio da mata primitiva. “Eu já imaginava que aqui era assim e vim por isso mesmo, atraído pelas caçadas e também com a intenção de ganhar a vida com mais facilidade, já que aqui eles davam terras devolutas”, disse Palhacinho em entrevista à Prefeitura de Paranavaí há algumas décadas.
O pioneiro se fixou na Brasileira porque tinha fé no futuro. “Enfrentei tudo sem medo”, garantiu. Ao longo da vida, José Ferreira sempre destacou as dificuldades enfrentadas nas décadas de 1940 e 1950. “Logo que cheguei aqui eu não sabia o que fazer. Minha ideia era abrir uma alfaiataria que era o meu ramo, mas eu achava que não daria certo. Aqui não tinha freguês”, revelou.
Outro problema era a falta de capital para investir na terra que recebeu do Governo do Paraná. As despesas com derrubada de árvores e formação de sítio eram muito caras, acessíveis a poucos. “Foi aí que o Dorvalino Moreira, que tinha uma pensão onde eu estava hospedado, falou para eu comprar a hospedaria. Naquele tempo, eu estava desanimado e tinha muitos filhos para criar. Então fechei negócio”, relatou José Ferreira que encontrou na diversidade de serviços uma saída para sustentar a família.
Palhacinho começou a trabalhar com a pensão, a alfaiataria e também como fotógrafo. Depois vendeu um sítio e usou o dinheiro para viajar a Londrina, onde comprou um equipamento de alto-falante que foi instalado na Rua Getúlio Vargas, no cruzamento com a Rua Souza Naves. “Instalei o serviço aqui com 80 discos”, lembrou e destacou que o negócio era novidade no interior do Paraná.
Em Paranavaí, havia poucos estabelecimentos comerciais até o final da década de 1940, o que motivou José Ferreira de Araújo a fazer um acordo com a Inspetoria de Terras, de quem recebia para anunciar a venda de terrenos. O primeiro cliente a contratar o serviço de alto-falante de José Ferreira foi o pioneiro mineiro José Alves de Oliveira, mais conhecido como Zé do Bar. “O único comércio da cidade era dele, então eu fazia os anúncios”, explicou Palhacinho.
O primeiro slogan
O primeiro slogan do pioneiro da publicidade em Paranavaí dizia o seguinte: “Quer trocar dinheiro? Zé do Bar! Quer tomar uma geladinha dentro do poço? Zé do Bar!” “No começo, foi difícil porque tinha poucas casinhas aqui. Mas fui indo, falando e trabalhando. Eu também contava piadas e anedotas. As pessoas se divertiam”, enfatizou.
O serviço de alto-falante também era usado para contar histórias e divulgar notícias. José Ferreira fez muitos anúncios de animais perdidos e encontrados, principalmente cavalos. “A coisa melhorou em 1946. Era uma barulheira de martelo dia e noite. Todo mundo construindo casas e tendo como fontes de luz apenas lampião, farolete e a Lua”, salientou.
Tinha ainda o barulho de sarilho por causa dos muitos poços de água que foram abertos na época. O movimento de pessoas em Paranavaí cresceu e o comércio também. “Tudo isso animava a gente”, comentou. Em 1948, Araújo fez uma parceria com os pioneiros João Machado e Raimundo Leite. Juntos, fundaram o primeiro cinema local, o Cine Theatro Paramounth, na Rua Marechal Cândido Rondon. “Fui até Maringá para aprender a passar filmes”, declarou.
Frase do pioneiro José Antonio Gonçalves
“As pessoas passavam nas esquinas para ouvirem as músicas do alto-falante do senhor Zequinha.”
Viagem ao Porto São José durava dias
O trecho da Estrada Boiadeira que ligava Paranavaí ao Porto São José foi aberto em 1939
Na época da colonização de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, para chegar ao Porto São José, por onde atravessava o gado que vinha do Mato Grosso, os pioneiros levavam pelo menos seis dias para percorrer um túnel no meio da mata.
O trecho da Estrada Boiadeira que ligava Paranavaí ao Porto São José foi aberto em 1939 pelo Capitão Telmo Ribeiro, homem designado pelo interventor Manoel Ribas para abrir vias em toda a região Noroeste do Paraná. No entanto, em 1941 a vegetação já havia coberto boa parte da estrada. Segundo pioneiros, qualquer via que não recebesse manutenção regular se tornava intransitável. No mesmo ano, Ribeiro exigiu que a estrada fosse recuperada.
Para facilitar as negociações de gado entre Mato Grosso e Paraná, o interventor Manoel Ribas tomou a decisão de inaugurar uma balsa no Porto São José. O evento também beneficiou muitos migrantes e viajantes que buscavam prosperidade no Noroeste do Paraná. “Vim pra Fazenda Velha Brasileira pela primeira vez logo que a balsa foi inaugurada em 1941”, relatou o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira.
No trajeto até a Brasileira, Marques de Siqueira colocou dois sacos na frente do carro para impedir que sementes de guanxuma entupissem o radiador, o que dá uma ideia da diversidade da flora paranaense naquele tempo. Em 1947, parte dos pioneiros começou a percorrer o trajeto de caminhão e em grupo. Se surgisse algum imprevisto, haveria pessoas o suficiente para ajudar. “A viagem ao Porto São José era muito difícil. Quando eu ia pra lá, levava pelo menos 14 dias de ida e volta, incluindo os dois dias de estadia”, frisou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho.
Quem viajava ao porto com veículo de tração animal sofria para atravessá-los. Não havia pontes em alguns trechos. “O jeito era colocar os mantimentos nas costas e atravessar os bichos de pouco em pouco. A gente tinha que fazer várias viagens, até passar todo mundo”, afirmou José Ferreira, acrescentando que depois era preciso recarregar a carroça.
Segundo Araújo, era uma luta entre ir e vir porque a estrada para o Porto São José consistia em um “túnel dentro da mata”. “A gente sofria bastante, mas valeu a pena porque conheci tudo”, avalia. Nas viagens para o Porto São José, Palhacinho sempre viu veículos abandonados pela estrada, principalmente pés-de-bode. “Isso aconteceu muito, ainda mais depois que os Rocha abandonaram as fazendas da Colônia Paranavaí. Os baianos que trabalhavam pra eles ficaram espantados e fugiram com medo da polícia. Largaram todos os carros”, revelou.
Outro pioneiro que conheceu o Porto São José no início dos anos 1940 foi o paulista Salatiel Loureiro. “Lembro que não existia nada no porto, só o nome. O picadão foi feito para o trânsito do gado que era levado pra Apucarana, Londrina e Ponta Grossa. Eles passavam pela Estrada Boiadeira e saíam em Jaguapitã e Sertanópolis [no Norte Central Paranaense]”, assinala. Quem também viajou algumas vezes para o Porto São José foi o pioneiro paulista Valdomiro Carvalho.
“Eu ia pro Mato Grosso buscar gado. A gente atravessava eles pelo porto, num vaporzinho”, pontua. Os personagens de destaque do Porto São José no período da Fazenda Brasileira e da Colônia Paranavaí eram o balseiro, de quem não se sabe o nome, e um homem conhecido apenas como “Seu Henrique” que desempenhava função semelhante a de um inspetor de terras.
Saiba mais
A Estrada Boiadeira era usada tanto por quem ia ao Porto São José quanto por quem ia a Londrina.