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Renato Esteves, um soldado pacifista no Oriente Médio

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Conhecido como Sete Metros, jovem de Paranavaí se destacou no Batalhão de Suez e recebeu condecoração da ONU em 1962

Renato Esteves ingressou no Batalhão de Suez com 23 anos (Foto: Acervo Familiar)

Renato Esteves ingressou no Batalhão de Suez com 23 anos (Foto: Acervo Familiar)

Em 1961, Renato Esteves Oliveira tinha 23 anos quando foi selecionado para ser um dos boinas azuis da Organização das Nações Unidas (ONU) no Canal de Suez, no Oriente Médio. O soldado deixou Paranavaí, no Noroeste do Paraná, porque queria ajudar a acabar com a guerra entre judeus e árabes, intensificada em 1956, quando Israel invadiu o Egito.

“A gente morava na fazenda e um dia o meu marido Joaquim [Mariano Silva] foi entregar leite e parou na venda de um português conhecido como ‘Seu Augustinho’, perto da Sanepar [Companhia de Saneamento do Paraná]. O comerciante disse que o meu irmão avisou que iria para o Canal de Suez [que liga o Mar Mediterrâneo ao Mar Vermelho]”, conta a aposentada Maria Aparecida Oliveira Silva.

Com a 7ª Companhia do 3º Pelotão do Batalhão de Suez, Renato Esteves, que era conhecido pela família como Lula e pelos amigos como Sete Metros porque tinha 1,92m de altura, precisou suportar uma viagem de navio com duração de 25 dias até chegar ao Oriente Médio, onde começou a patrulhar na Linha de Demarcação do Armistício (LDA). “Lembrei muito de vocês. Foram muitos dias e noites vendo apenas água, mas deu pra passar na África e na França. Se Deus quiser, vou a Jerusalém na Semana Santa. Também quero levar pra vocês um pouquinho de água do Rio Jordão”, prometeu Renato Esteves à família em carta de 19 de novembro de 1961.

Na LDA, o trabalho do soldado era ajudar a garantir a paz. Ou seja, não permitir que a zona neutra fosse ocupada por israelenses e árabes, caso surgissem provocações ou tentativas de transposição. Se houvesse alguma suspeita, deveria avisar os superiores. Como era voluntário, Sete Metros viajou para o Egito sem se preocupar com salário, mas quando chegou lá ficou feliz com a remuneração paga pela ONU. “Sinto saudade de Paranavaí, mas gosto muito daqui porque o ordenado que ganho em um mês equivale ao salário de um ano no Brasil. Já estou com quinhentos dólares na caixa”, escreveu em carta de novembro de 1961.

Sete Metros com um pé no Egito e outro em Israel (Foto: Acervo Familiar)

Sete Metros com um pé no Egito e outro em Israel (Foto: Acervo Familiar)

De natureza pacífica, o soldado, também chamado de Pracinha 4307 por causa do seu número de identificação, se orgulhava de não ter matado ninguém em 1961 e 1962, período em que fez parte do Batalhão de Suez. Na fronteira do Egito com Israel, teve de aprender a lidar com o perigo. Era preciso resistir ao calor escaldante, às frequentes e violentas tempestades de areia e às minas terrestres instaladas nas áreas de patrulhamento. À noite, dormiu muitas vezes em uma barraquinha de tecido branco ao lado da guarita B17. Independente das dificuldades, Sete Metros tentava resolver qualquer situação da forma mais amistosa possível. Só ficava feliz em empunhar uma arma quando era para ser fotografado. Gostava de impressionar a família, amigos e as moças com quem se correspondia.

Na fronteira, teve de aprender a lidar com o perigo (Foto: Acerco Familiar)

Na fronteira, teve de aprender a lidar com o perigo (Foto: Acerco Familiar)

Em 23 de novembro de 1961, o soldado afirmou que quando estava de folga passava o dia escrevendo cartas. “Cida [irmã], compre a revista Sétimo Céu que você vai ver o meu nome na última página. Já recebi mais de 300 cartas. Tem muitas moças aí do Brasil querendo me conhecer. Pergunte ao Sandro [um amigo] se ele ainda está levando um papo com aquela mineira. Estou levando um papo firme com uma de Itajubá [Minas Gerais]. Tem mais algumas de outros estados que vão me esperar na Praça Mauá quando o navio [Soares Dutra] atracar no Rio de Janeiro”, relata. Naquele tempo, como Paranavaí não tinha agência dos Correios, as correspondências eram retiradas na Casa Lusitana na Rua Manoel Ribas ou na Casa Moreira na Avenida Distrito Federal.

Trabalhando no Canal de Suez, Renato Esteves fez muitas amizades com egípcios e israelenses. À época, os boinas azuis tinham à sua disposição um avião para viagens de lazer. “Estou gostando bastante da minha vida aqui. Já conheci Beirute, no Líbano, e também o Cairo, a capital do Egito, além da Grécia. Da última vez, encontramos o presidente Juscelino Kubitschek assim que chegamos. Ele veio visitar o nosso batalhão e nos parabenizar”, narra em carta enviada à irmã no dia 13 de janeiro de 1962, acrescentando que a viagem do Cairo até Jerusalém levava 40 minutos de avião.

Enquanto viveu no Oriente Médio, nada abalou mais o pracinha do que a notícia de que o irmão João Ramos Oliveira morreu envenenado. “O meu irmão era meu amigo. A gente estudava junto e ele morreu. Falei pra ele não ficar triste com a minha partida porque eu voltaria logo”, confidenciou dias depois. Em tributo ao irmão, agendou uma missa em uma igreja católica ortodoxa de Jerusalém e tirou uma foto ajoelhado e orando. O que ajudou Sete Metros a lidar com a perda foi a amizade com uma criança egípcia de menos de dez anos. Todos os dias o soldado recebia a visita do menino que percorria quilômetros a pé para vê-lo. Quando o garotinho não podia visitá-lo, Renato Esteves ia até ele. Os dois se tornaram inseparáveis.

No canto à esquerda, o soldado acompanha a chegada de Juscelino Kubitschek (Foto: Acerco Familiar)

No canto à esquerda, o soldado acompanha a chegada de Juscelino Kubitschek ao Oriente Médio (Foto: Acerco Familiar)

Embora tivesse pai, o menino viu no brasileiro uma nova figura paterna. “O Lula ficava muito tempo em uma guarita e quase sempre aquela criança o acompanhava. Levava o menino para o acampamento, comia com ele, dava presentes. O pai do garotinho também ia de vez em quando e gostava do relacionamento dos dois. Ele via uma rara bondade no meu irmão”, assinala Maria Aparecida.

Uma das brincadeiras preferidas da dupla era deitar no chão quando surgia alguma rápida tempestade. Em poucos segundos, seus corpos sumiam na imensidão desértica, cobertos pela areia. A criança ficou tão apegada ao pracinha que um dia pediu que o trouxesse ao Brasil. Como o garotinho tinha família, Esteves admitiu que não poderia fazer isso. “Você me põe dentro de uma caixa e fecha. Quando for passar na vistoria, eu vou com você”, sugeriu.

Renato em missa em memória do irmão em Jerusalém com os amigos do Batalhão de Suez (Foto: Acervo Familiar)

Rodeado de amigos do Batalhão de Suez na missa em memória do irmão (Foto: Acervo Familiar)

Sete Metros se sentiu tentado a trazer o menino, mas sabia que seria errado. Durante algum tempo ainda trocaram correspondências, até que as mudanças da vida fizeram com que perdessem contato. Quando retornou ao Brasil, o soldado passou um período no Rio de Janeiro, atuando no Exército. De volta a Paranavaí, quis seguir carreira militar. Então foi para Maringá, onde se tornou policial. “Como morávamos em uma fazenda e meu irmão gostava muito de viajar, ele sempre tinha um quarto reservado em um hotel perto do Terminal Rodoviário de Paranavaí. Era tudo muito bonito e bem arrumado”, explica Aparecida.

Após alguns anos, começou a namorar uma moça em Paranavaí, sem saber que a jovem também estava envolvida com outro homem. Um dia, os dois rapazes se encontraram e se estranharam. A discussão terminou em luta e Sete Metros sacou a arma primeiro e atirou no seu agressor que faleceu no local. Familiares de Esteves testemunham que a moça manipulou a situação, colocando um contra o outro. Depois da tragédia, o rapaz que fazia parte do Destacamento Policial de Nossa Senhora das Graças, na microrregião de Astorga, se entregou na delegacia de Paranavaí, alegando que estava preparado para ser punido pelo que aconteceu. Renato Esteves admitiu a culpa e aceitou a sentença.

Se ajoelhou e orou pelo irmão em uma igreja em Jerusalém (Foto: Acervo Familiar)

Orou por João Ramos em uma igreja ortodoxa em Jerusalém (Foto: Acervo Familiar)

Maria Aparecida acredita que o destino poderia ser diferente se o irmão não tivesse retornado a Paranavaí. Pelos serviços prestados no Canal de Suez, Sete Metros recebeu uma condecoração de soldado de destaque da ONU no Rio de Janeiro. O prêmio proporcionou grande visibilidade. “Sempre tinha gente tentando arrumar confusão com ele. Havia muita inveja. O Lula me contava que até os colegas de trabalho implicavam muito com ele”, frisa a irmã que até hoje não entende como o irmão, alguém tão calmo, educado e pacífico se colocou em uma situação tão antagônica à própria natureza.

Quando estava preso em Paranavaí, antes de receber a sentença, foi ameaçado muitas vezes. “Cansado e preocupado, ele pediu que eu falasse com o [deputado federal] doutor José de Alencar Furtado para acelerar a transferência dele”, revela a irmã. Após a mudança para a Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara, na região metropolitana de Curitiba, a família começou a visitá-lo aos sábados. “Eu ia sempre à noite, daí amanhecia lá e o encontrava pela manhã”, enfatiza Aparecida Oliveira que não ficava muito tempo sem ver o irmão.

Com o garoto egípcio que se tornou seu melhor amigo (Foto: Acervo Familiar)

Com o garoto egípcio que se tornou seu grande amigo (Foto: Acervo Familiar)

Só que tudo mudou no dia 6 de janeiro de 1970, quando Sete Metros estava na fila do refeitório segurando uma bandeja e aguardando o momento de pegar a comida. Um detento conhecido como Mergulhão que estava logo atrás o golpeou três vezes nas costas com um “estoque” de ferro. Quando o rapaz caiu no chão, um amigo correu para socorrê-lo. Desprevenido, também foi golpeado várias vezes. Os dois morreram no refeitório da penitenciária sem a intervenção de ninguém, nem mesmo de funcionários do complexo prisional.

Mais tarde, a família de Renato Esteves descobriu que o crime foi encomendado por um tenente de Paranavaí. “Meu irmão virou notícia em praticamente todas as emissoras de rádio do Paraná. Fiquei muito revoltada porque os soldados e policiais que eram amigos dele ficaram sabendo da morte no dia do acontecido e não avisaram a gente. Quando eu soube, fui até a barbearia frequentada por eles e discuti com todo mundo. O único que se preocupou em nos procurar foi o compadre Jobi, um ex-soldado já falecido”, garante Aparecida.

Em Curitiba, o deputado federal José de Alencar Furtado designou o próprio motorista para acompanhar a irmã de Renato Esteves até Piraquara. “Foi muito gentil e disse que o motorista poderia me levar onde eu precisasse”, comenta. Na penitenciária, Maria Aparecida entregou uma carta escrita por Alencar Furtado. Se emocionou quando viu que do irmão restou apenas uma mochila pequena com poucos pertences. Muitos itens pessoais foram furtados, não se sabe se por outros detentos ou por funcionários da prisão.

Maria Aparecida: "O Lula ficava muito tempo em uma guarita" (Foto: Acervo Familiar)

Maria Aparecida: “O Lula ficava muito tempo em uma guarita” (Foto: Acervo Familiar)

O corpo de Sete Metros foi transferido do Instituto Médico Legal (IML) para um caixão grande e azul. Antes taparam com algodão os três ferimentos causados pelos golpes. Também o vestiram com uma de suas roupas preferidas, limpinha e perfumada, embora já não pudesse mais senti-la. Na viagem a Paranavaí, a ambulância que trouxe o corpo do rapaz parou em Alto Paraná, onde a família de Renato Esteves era bem conhecida. “Quando chegamos lá, muitos que estavam próximos da prefeitura se aproximaram e falaram: ‘Nossa! Esse é o filho do Aureliano!’”, lembra Maria Aparecida visivelmente emocionada.

Depois de avisar os amigos, a família o velou por uma noite e o sepultou no dia seguinte. A mãe de Sete Metros, a portuguesa Maria Esteves, que já tinha perdido o filho João Ramos Oliveira em 1962, não resistiu a mais uma perda e adoeceu gravemente. Em 1970, faleceu alguns meses após a morte do filho Renato Esteves Oliveira que partiu sem imaginar que em 1988 o Batalhão de Suez receberia o Prêmio Nobel da Paz.

Soldado escrevia todos os dias para a família em Paranavaí

Se tornou amigo de árabes e israelenses (Foto: Acervo Familiar)

Fez amizade com árabes e israelenses (Foto: Acervo Familiar)

Enquanto prestava serviços para a Força de Emergência das Nações Unidas (Unef) no Oriente Médio, o soldado Renato Esteves Oliveira, conhecido como Sete Metros, escrevia todos os dias para a família em Paranavaí. Também gostava de enviar presentes. Curiosamente, as encomendas que saíam do Brasil para o Egito sempre chegavam, mas as que partiam do Canal de Suez para cá muitas vezes eram extraviadas. “O avião que leva as encomendas só vem aqui uma vez por mês. Elas chegam através do Ministério da Guerra, no Rio de Janeiro”, explicou o pracinha em carta de 1º de janeiro de 1962, seis meses antes de retornar ao Brasil.

Entre os produtos enviados por Sete Metros estavam tapetes, chinelos, navalhas, roupas e brinquedos. “Ele enviou ‘chinelo de dedo’ pra gente numa época em que aqui ainda não existia. Mandou também uma réplica de um camelinho bem bonitinho para o Pedrinho [sobrinho já falecido]. Depois de mais de 50 anos, ainda guardo com carinho”, assegura a irmã Maria Aparecida Oliveira Silva.

Sete Metros comemorando o aniversário em 10 de abril de 1962 (Foto: Acervo Familiar)

No Egito, comemorou o aniversário em 10 de abril de 1962 (Foto: Acervo Familiar)

Em 1961, o pracinha experimentou pela primeira vez uma cerveja em lata no Egito, versão que os brasileiros conheceriam só em 1971. Gostou tanto da bebida que em 10 de abril de 1962 comemorou o aniversário rodeado de amigos e uma mesa repleta de latinhas. “Como aqui não existia, ele trouxe de lá. Junto veio um baú com tapetes e roupas para toda a família. Tinha muitas novidades, coisas que não se via no Brasil”, conta Aparecida, lembrando que o irmão geralmente pedia para enviarem jornais, cigarros e revistas, principalmente O Cruzeiro, uma de suas preferidas. No entanto, as remessas não podiam ultrapassar 20 quilos.

Teve de resistir ao calor escaldante, violentas tempestades de areia e minas terrestres (Foto: Acervo Familiar)

Resistiu ao calor escaldante, violentas tempestades de areia e minas terrestres (Foto: Acervo Familiar)

Em carta de 25 de novembro de 1961, Renato Esteves pediu que o pai fosse a uma barbearia para perguntar o preço da navalha alemã Solingen. “Aqui é muito barato. Eu mando pra ele vender. Vou enviar também um embrulho com tapete que não existe aí. Diga para o pai repassar por dois mil cruzeiros. Quem não quiser comprar, é só mandar vir buscar aqui no Egito”, ironizou. No Canal de Suez, o traje tradicional de Sete Metros incluía farda, boina, anel de formatura, cachecol e um cinto de couro com uma pistola 45 e uma submetralhadora INA. “Nunca deixei de mandar uma resposta pra ele. Tenho um pacote enorme de cartas que me enviou. Estão todas velhinhas e amarelas”, revela a irmã.

Sete Metros abominava injustiças

Foi justamente por abominar injustiças que Renato Esteves Oliveira, o Sete Metros, optou por deixar o trabalho no campo para se tornar soldado e depois policial. Nos anos 1960, a Polícia Militar do Paraná não tinha uma divisão específica para lidar com situações de alta gravidade, então no Norte do Paraná convocavam Sete Metros que logo ficou famoso por prender alguns dos criminosos mais perigosos que atuavam na região.

Apesar da curta carreira como policial militar, Renato Esteves desmantelou inúmeras quadrilhas de assaltantes e sequestradores. “Era temido pelos bandidos porque sabia como reagir em qualquer situação. Foi o responsável por acabar com ondas de tiroteios e outras ações criminosas em cidades como Nossa Senhora das Graças, Jaguapitã e Colorado”, garante a sobrinha Maria Neuza Silva. Mesmo quando estava de folga, o policial costumava intervir em casos de injustiça.

Maria Neuza se recorda das vezes em que na infância ela e o irmão Luiz Ademir saíam com o tio para comer pão com sardinha. “Era a comida preferida dele. Ele também adorava o seu jipe e gostava muito de mecânica. Foi criado na roça, mas não se identificava com o campo”, comenta a sobrinha.

Trecho de uma carta escrita por Renato Esteves em 19 de novembro de 1961

Renato Esteves na rampa do navio Soares Dutra quando chegou ao Brasil (Foto: Acervo Familiar)

Renato Esteves na rampa do navio Soares Dutra quando chegou ao Brasil (Foto: Acervo Familiar)

Saudações,

prezada irmã Cida. É com muito prazer que pego na pena para responder a sua cartinha recebida há poucos dias. Que bom saber que todos estão com saúde. Também vou bem graças a Deus. Fiquei muito contente de saber que recebeu carta minha e que continua me escrevendo. Quando for na Casa Lusitana, procure carta no nome do pai porque escrevi muitas. Cida, quero que tu me mande umas cinco revistas, daí quando eu receber vou te mandar um corte de vestido que aí no Brasil não tem desse pano. Tu fala para a mãe que eu mando um pra ela também. O Tim [irmão] mandou eu levar um revólver pra ele. Manda ele preparar a grana que na volta eu passo na Itália e compro a arma direto da fábrica.

Você disse na carta que o Zé [irmão] ainda não voltou e que o Francisco [cunhado] já está bom. Eu desejo felicidades pra eles. Cida, você falou que o pai conseguiu o endereço do Feliciano. Ele foi meu colega quando servimos o Exército no Rio de Janeiro. Ele queria vir pra Suez. Aqui o ordenado de um soldado é de 32 contos por mês e se Deus quiser vai vir aumento pra nós agora com a saída do Jânio Quadros. Você falou na carta que está chovendo aí. Aqui passa até um ano sem chuva. Começou o frio agora em novembro e vai até março. Quando vocês estão jantando, aqui é meia-noite e eu já estou dormindo. Deixo a minha benção ao pai, mãe e meus sobrinhos. Lembranças para todos daí.

Saiba Mais

45 anos após sua morte, o túmulo de Renato Esteves Oliveira, tio-avô do autor da reportagem – David Arioch, ainda recebe muitas visitas no Cemitério Municipal de Alto Paraná.

Sete Metros era tão respeitado que uma semana após a sua morte alguns detentos se uniram e mataram o criminoso conhecido como Mergulhão.

Frases de Renato Esteves Oliveira

“Cida [irmã], quando me escrever, mande perguntar na Fazenda Ouro Verde se tem família nova. Se alguma colega da Clarisse perguntar de mim, dê o meu endereço que é pra eu treinar a caligrafia porque a minha letra está um pouco ruim.”

Nos anos 1950 e 1960, era muito comum os casos de envenenamento em Paranavaí e região. Então um dia Renato disse: “Ô Pai, nunca tome nada que te derem para beber sem antes ver a pessoa abrir a garrafa na sua frente.”

Por que os soldados brasileiros foram enviados para o Canal de Suez?

De acordo com o Manual do Expedicionário Brasileiro em Suez, a Força Internacional das Nações Unidas enviou soldados brasileiros para fazer uma interposição entre árabes, israelenses, franceses e ingleses. O objetivo era evitar que guerreassem. Em 1956, o desentendimento entre os quatro povos teve como estopim a nacionalização do Canal de Suez pelo presidente egípcio Gamal Abdel Nasser, apoiado pela União Soviética. Com isso, franceses, ingleses e israelenses não poderiam mais usar o canal como rota estratégica de navegação para Ásia, África e Europa.

Com o apoio dos Estados Unidos, França, Inglaterra e Israel se uniram para atacar o Egito. Preocupada com a possibilidade do conflito se transformar em uma Terceira Guerra Mundial, a ONU agiu rapidamente e enviou tropas de paz para o Canal de Suez. Lá, brasileiros trabalharam em parceria com soldados da Noruega, Suécia, Dinamarca, Finlândia, Iugoslávia, Índia, Colômbia e Indochina.

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Um homem marcado pela tragédia

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Quando a riqueza material ofusca a importância da vida

Paranavaí quando Hésio Azeredo viveu aqui uma sucessão de tragédias (Foto: Toshikazu Takahashi)

Paranavaí quando Hésio Azeredo viveu aqui uma sucessão de tragédias (Foto: Toshikazu Takahashi)

Na infância, meu avô me contou uma história que jamais esqueci. É sobre um homem que teve a vida transformada por uma sucessão de tragédias em 1958 e 1959. Até o ano passado, sempre me questionei se o que ouvi quando criança era verdade ou não. A confirmação chegou até mim há alguns meses, quando encontrei uma sobrinha do protagonista desta sinistra e pitoresca história.

Hésio Oscar Azeredo era um investidor de grandes posses que vivia com a família em uma fazenda a pouco mais de 20 quilômetros da área urbana de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. Passava o tempo todo ocupado, tentando encontrar novas formas de multiplicar os lucros. Havia época em que dormia menos de três horas porque achava que repousar mais o impediria de alcançar seus objetivos. “Ele tinha uma boa família e era uma boa pessoa, mas colocava o dinheiro e a ambição acima de tudo”, diz a sobrinha Maria Aparecida Lorelli.

Hésio Oscar era filho único de um falecido casal de multimilionários que até as primeiras décadas do século XX administrava investimentos de capital estrangeiro no Brasil. Ainda jovem, já possuía propriedades rurais em sete estados, além de fazendas no Paraguai e Argentina. Algumas eram maiores do que muitas cidades do Brasil. Também investia em beneficiamento de grãos e cereais, telefonia e transportes fluviais. Era muito influente, tanto que na sua biblioteca particular, um ambiente inspirado no gabinete do presidente dos Estados Unidos – o Salão Oval, deixava em destaque uma grande foto em que aparecia ladeado pelo ex-presidente Dwight Eisenhower.

“A moldura do quadro era de ouro maciço. Poucas pessoas podiam entrar lá. Somente alguns familiares conheciam o lugar. Meu tio ainda pedia que por discrição ninguém falasse sobre o que viu lá dentro”, declara Maria que na infância e adolescência teve três oportunidades de visitar o local. Apesar do apego aos bens materiais, o investidor era considerado pelos empregados como um patrão rigoroso, mas justo. Fazia questão de acompanhar de perto todos os seus negócios. Ainda assim, muitos boatos se espalhavam sobre o Tymbara, apelido que um místico colono de origem kaingang deu a Hésio Azeredo. “Era o único índio da nossa turma. Ele inventou esse apelido e não explicou o significado. Só que ninguém nunca teve coragem de chamar o ‘Dr. Hésio’ de Tymbara, então isso ficava mais entre a gente”, comenta o ex-colono aposentado Inácio Durval Reis que naquele tempo era mais conhecido como Mizim.

Nos anos 1950, o investidor construiu um escritório inspirado em Eisenhower e no Salão Oval (Foto: Reprodução)

Nos anos 1950, o investidor construiu um escritório inspirado em Eisenhower e no Salão Oval (Foto: Reprodução)

Em 1957, já circulava entre os colonos um boato de que Azeredo se referia ao dinheiro como se fosse um tipo de deidade. “Falavam que ele tinha um altar cheio de dinheiro e que não saía de lá sem se ajoelhar e rezar pra ganhar mais um punhado a cada dia”, conta Mizim, acrescentando que talvez tenha sido apenas conversa fiada de gente à toa.

Há quem diga que uma cozinheira da fazenda jurou ter visto paredes forradas com notas de cem dólares em alguns dos cômodos da casa principal. “Todo mundo ouvia falar. Só que não conheço ninguém que testemunhou isso. Sei que tinha cômodos da casa que o ‘Dr. Hésio’ não permitia a entrada de ninguém, nem das empregadas”, enfatiza Reis. Embora as lembranças não estejam mais tão frescas na memória, Maria se recorda com carinho da tia Clara e dos primos Tadeu e Joaquim. “Eram bem espertos e adoravam correr pelo campo. Na fazenda, perto de uma bica de mina, tinha um morrinho coberto por uma grama bem verdinha onde eles adoravam escorregar e rolar. Às vezes eu e uma babá cuidávamos dos dois”, comenta.

Tadeu, de cabelos negros que chegavam a azular com a incidência do sol vespertino, era bem comunicativo e agitado. Já Joaquim, de cabelos loiros, era calmo e parcimonioso. Os dois sofriam de heterocromia. “Tadeu tinha um olho preto e um azul. Joaquim possuía um olho preto e um verde. Por causa disso, eu ficava sabendo de muitas bobagens ditas pelos mais ignorantes”, lembra Maria Lorelli. Hésio Azeredo pouco participava do cotidiano familiar. Assistia ao desenvolvimento dos filhos como um espectador desatento. Tinha o hábito de viajar antes do amanhecer, retornando apenas semanas mais tarde e normalmente de madrugada. A pressa era tanta que nem se despedia dos filhos. Se o lucro fosse muito alto e exigisse mais tempo fora de casa, não se importava em se ausentar por alguns meses. Uma vantagem é que o empresário sempre teve pessoas de sua confiança para garantir o bom andamento dos seus muitos empreendimentos.

Criado em uma família que há várias gerações se dedicava a multiplicar riquezas, Azeredo foi o primeiro a romper o ciclo, e não por vontade própria, mas por uma sucessão de acontecimentos que transformaram sua vida. Em dezembro de 1958, após uma séria discussão com o marido, Clara chamou os dois filhos e disse a eles que iriam passar alguns dias na casa da avó em Curitiba. “Ajudei eles a arrumarem as malas e os acompanhei até o aeroporto da família, onde um avião e um piloto estavam sempre à disposição”, relata Maria. No último momento, apesar da resistência em deixá-los partir, Hésio Oscar achou que contrariar a mulher poderia piorar a situação. No início da noite, se arrependeu amargamente ao receber a notícia de que o piloto Julião Martins Bastina sofreu um mal súbito e perdeu o controle da aeronave. O avião que caiu na região dos campos gerais foi encontrado por um caminhoneiro que viu uma criança ensanguentada acenando e gritando por socorro.

“A tia Clara, o Joaquim e o piloto não resistiram aos ferimentos. Acho que morreram na hora do impacto. O Tadeu sobreviveu por um milagre. Ele teve só escoriações e não precisou ficar internado”, destaca Maria Aparecida. A maior parte do sangue sobre o corpo do garoto era do irmão e da mãe que o envolveu nos braços instantes antes da queda. Pelo menos por dois meses após o enterro, a tragédia fez de Azeredo um homem incomunicável, agressivo e ostracista. Não tinha vontade de ver ninguém, nem mesmo o filho sobrevivente. Depois retornou à rotina sem avisar ninguém. E não aceitava que falassem das mortes da mulher e do filho, negando a si mesmo a partida dos dois, mesmo tendo participado da cerimônia fúnebre.

Avião com a mulher e os filhos de Hésio caiu nos Campos Gerais (Foto: Reprodução)

Avião com a mulher e os filhos de Hésio caiu nos Campos Gerais (Foto: Reprodução)

Sem saber como lidar com a vida pessoal, até mesmo esquecendo que tinha família, se afundou ainda mais em trabalho. Esqueceu muitas vezes que Tadeu continuava morando na mesma casa. “O pai dele tinha atitudes de alguém que perdeu tudo. Em vez de se basear naquele exemplo para mudar de vida, fez exatamente o contrário. Fiquei muito nervosa com a situação”, desabafa a sobrinha. Isolado por Hésio Oscar, Tadeu começou a agir como se o irmão Joaquim continuasse com ele. Maria Lorelli foi a primeira a perceber que o primo divagava e tinha alucinações. Parecia falar com outras pessoas, mesmo quando estava sozinho. Quem o via de longe, pensava que havia alguém acompanhando o garoto.

“Ele corria lá pelos lados das plantações. Se embrenhava no meio do cafezal e brincava de se esconder. Lembro que perguntei se tinha mais alguém com ele. Me respondeu que era o irmão. Achei que fosse uma traquinagem inocente, nem comentei com ninguém”, revela Mizim. Episódio semelhante se repetiu uma semana mais tarde, quando Tadeu estava sozinho no quarto, escondido e cochichando dentro do guarda-roupa. Com a insistência dos mais próximos, Azeredo concordou em procurar um tratamento psiquiátrico para o filho. Tadeu foi diagnosticado com transtorno do estresse pós-traumático. Mesmo com acompanhamento médico, o estado do garoto só piorou. Embora se preocupasse com a situação, Hésio preferia deixá-lo aos cuidados de familiares e empregados.

Um dia, quando se machucou ao saltar sobre uma cerca, a perna de Tadeu começou a sangrar. Ele se aproximou do pai e disse: “Por que o senhor não gosta de mim? É por que o que sai do meu corpo é um líquido vermelho sem valor? Mas e se fosse amarelo e brilhante como ouro?” Azeredo não respondeu. Surpreso, se calou e abraçou o filho, clamando por perdão. A cena foi testemunhada ao longe pela prima Maria. Na semana seguinte, três dias antes de completar 12 anos, Tadeu foi encontrado deitado na própria cama, abraçado a uma foto em que ele aparecia brincando com a mãe e o irmão. Havia um pequeno frasco de estricnina ao seu lado. Tadeu estava morto e com os olhos fechados, como se estivesse se preparando para dormir. Quando viu o filho de pijama e sem vida, Hésio saltou pela janela do quarto que ficava no andar superior. O impacto provocou apenas um corte na cabeça, escoriações e um desmaio que durou cerca de duas horas. Ao acordar, teve uma cefaleia intensa que desapareceu só no fim da noite.

Maria Lorelli tentou conversar com o tio sobre a necessidade de velar e enterrar Tadeu, mas Hésio não quis dialogar. Deixou claro que não precisava da ajuda de ninguém, assumindo o compromisso de fazer tudo sozinho. Só exigiu que dois empregados levassem um enorme refrigerador horizontal, que estava na maior despensa da casa, até um quarto ao lado do seu. Mandou que todos saíssem, tomou Tadeu nos braços e o carregou para a sua suíte. Chaveou a porta do quarto e disse aos familiares que retornaria em algumas horas. Antes que alguém fizesse alguma pergunta, entrou em um jipe Land Rover e desapareceu na escuridão, retornando antes do amanhecer, acompanhado de um húngaro misterioso e com um forte sotaque a quem chamava de Gazda. Transferiram Tadeu para o quarto ao lado da suíte e não permitiu que ninguém entrasse no local.

Modelo do jipe usado por Azeredo em 1959 (Foto: Reprodução)

Modelo do jipe usado por Azeredo em 1959 (Foto: Reprodução)

No dia seguinte pela manhã, Azeredo estava mais calmo e convidou parentes e amigos mais próximos para participarem de enterro do filho no cemitério particular da família. Estranharam a atitude porque Hésio nem mesmo havia planejado o velório. Por comiseração e até por medo de uma má interpretação, ninguém cogitou questioná-lo por não deixar ninguém ver Tadeu antes de fechar o caixão. Algumas das pessoas que participaram da cerimônia, segundo Maria Lorelli, comentaram que Azeredo parecia mais lúcido e provavelmente, após o rompante de desespero, logo entraria na fase de aceitação. Quando todos os parentes foram embora, Azeredo dispensou parte dos empregados, justificando que como estava sozinho não precisava mais de tantas pessoas trabalhando na casa principal. Maria insistiu em continuar com o tio por mais alguns dias, mesmo ciente de que talvez não fosse mais bem-vinda. “Desconfiei de algo estranho acontecendo porque o tal húngaro que ninguém conhecia ficou na casa quase uma semana. Além disso, ele não parecia o tipo de pessoa com quem o tio costumava negociar”, argumenta.

Algumas horas antes de Gazda partir, Maria o ouviu cochichando algumas palavras ininteligíveis a Hésio. Sem motivo para prolongar a estadia, a jovem partiu para Curitiba, onde ingressou no curso de medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Nas férias, Maria sempre passava alguns dias na fazenda do tio para saber como ele estava e também para reviver lembranças do tempo em que ajudava a tia Clara e os primos Tadeu e Joaquim. Azeredo estava mais comunicativo e não viajava com muita frequência. Na realidade, raramente deixava a fazenda. A propriedade do empresário se tornou o seu mundo, tanto que as negociações diminuíram consideravelmente. Em 1962, apenas nove dos empregados continuaram trabalhando na propriedade. Era o suficiente para manter a operacionalização das atividades locais.

No final daquele ano, por intermédio dos pais, Maria ficou sabendo que Hésio, sem dar explicações, desfez de grande parte dos imóveis e empresas que possuía. Mas a surpresa maior veio em janeiro de 1963, quando Maria encontrou a fazenda abandonada. As plantações estavam morrendo e não havia ninguém no campo. Na casa principal, a sobrinha sentiu um forte mau cheiro vindo da cozinha, onde muitos alimentos estragaram há bastante tempo. Maria também se deparou com móveis cobertos por lençóis brancos. Nada disso pareceu tão estranho quanto uma bem disposta e linear trilha de notas de cruzeiro que começava no cemitério particular da família e terminava no quarto de Hésio Azeredo.

Maria Lorelli seguiu as notas e quando abriu a porta do quarto viu o tio deitado na cama abraçado com o filho Tadeu. Mesmo sem vida, o garoto estava com a aparência do dia em que foi encontrado morto. “Como participei do enterro dele três anos antes, pensei que eu estivesse louca. Até a expressão no rosto de Tadeu ainda era a mesma”, comenta. Após o susto, Maria viu que Hésio também estava morto. Ao lado do corpo, somente um frasco quase vazio de estricnina. Preocupada com a repercussão, a família de Maria evitou comentários e fez o possível para impedir que a história fosse divulgada. Até mesmo no registro de óbito consta que a causa da morte foi um ataque cardíaco. O caixão onde supostamente colocaram o corpo de Tadeu em 1959 sempre esteve vazio. O substituíram por outro e realizaram uma nova cerimônia fúnebre para pai e filho. Desta vez, com a participação de cinco pessoas. Antes de morrer, Hésio Azeredo deixou um testamento destinando 80% da fortuna para orfanatos, asilos e entidades sociais que cuidavam de crianças de rua.

O restante foi dividido entre sete familiares e dois irmãos de criação. Em um bilhete queimado no mesmo dia em que foi lido, Hésio explicou brevemente que o húngaro Gazda era um artista da matéria humana que lhe proporcionou, mesmo que por pouco tempo e com certo requinte ilusionista, se comunicar e se despedir do filho de uma maneira que ninguém jamais entenderia. Anos depois, Maria Lorelli ouviu novamente falar de Gazda em São Paulo. Então soube que o homem misterioso foi um dos mais revolucionários taxidermistas do Leste Europeu, onde trabalhou para czares, aristocratas e líderes socialistas. Se mudou para o Brasil nos anos 1940, fugindo da perseguição nazista aos ciganos.

Curiosidade

Tymbara é uma palavra de origem tupi-guarani que significa “aquele que enterra”.

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Alegria e sofrimento na era de ouro do rádio

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Ephraim Machado: “A gente tocava tudo com motor e bateria de carro”

Machado: "Difícil era fazer o aparelho funcionar numa época sem energia elétrica" (Foto: Diário do Noroeste)

Machado: “Difícil era fazer o aparelho funcionar numa época sem energia elétrica” (Foto: Diário do Noroeste)

 O pioneiro e empresário Ephraim Marques Machado chegou a Paranavaí, no Noroeste Paranaense, em 1948, pouco tempo depois que seu pai, agente fiscal do Governo do Paraná, foi enviado para instalar a Coletoria Estadual. Admite que no primeiro momento não gostou do que viu na colônia, então retornou para Londrina, onde morava com o tio Odinot Machado, homenageado com um nome de rua em Paranavaí. “Fiquei lá uns seis meses e meu pai insistiu outra vez. Disse que estava muito bom aqui, então voltei”, relata.

A princípio, Machado iria apenas ajudar o pai, mas dois meses depois decidiu investir em um serviço de alto-falantes. “Eu já queria conquistar a minha independência”, conta o pioneiro que nasceu em Castro, na região de Ponta Grossa, no Centro Oriental Paranaense. No final de 1948, Ephraim circulava pela cidade com um microfone e uma caixa amplificadora. Até hoje, lembra como as “vozes saíam por cima”. A sede da modesta rede de comunicação de Machado ficava em frente à Banca do Wiegando, na Rua Marechal Cândido Rondon, de onde administrava os dez alto-falantes espalhados em pontos estratégicos da cidade.

Algumas caixas podiam ser vistas perto do antigo Terminal Rodoviário e outras onde é hoje a Academia Unimed, na Avenida Distrito Federal. Quando o pioneiro anunciava algo em uma caixa, a mesma mensagem era reproduzida em todas as outras. “Foi assim até 1956, quando coloquei a Rádio Cultura no ar, um trabalho iniciado em 1950. Contratava gente da cidade e de fora, o que aparecesse”, explica. A sede da emissora na Rua Getúlio Vargas no cruzamento com a Rua Minas Gerais, onde era a Loja Ipiranga, chegou a ter três andares, dois construídos por Machado e um por Luiz Ambrósio.

Como a maior parte da população não tinha televisor e o cinema abria as portas somente aos sábados e domingos, o pioneiro cativava a comunidade com os programas de auditório. “Sempre aproveitava para levar ao Aeroclube [atual tênis Clube – em frente ao Ginásio Lacerdinha] os artistas que se apresentavam na rádio. Então o povo tinha a chance de assistir shows do Jorge Goulart, Nora Ney, Mestre Sivuca, Orquestra Casino de Sevilla e muitos outros”, cita.

No começo, o empresário tinha uma equipe de oito profissionais. Do total, cinco eram locutores. Quem chefiava a redação era o jornalista Ivo Cardoso, mas as notícias eram apresentadas por Jackson Franzoni e Evaldo Galindo. Havia muitos colaboradores, o que fazia a diferença quando surgiam problemas técnicos. “O equipamento de transmissão não era tão caro. O difícil era fazer o aparelho funcionar numa época sem energia elétrica. A gente tocava a rádio com motor e bateria de carro. Tudo era grande, até o gravador”, destaca.

Os problemas de transmissão eram frequentes, pois nem sempre o gerador de energia funcionava como o esperado. Às vezes, a rádio ficava dias fora do ar, um sofrimento inevitável. “Quando surgiu a primeira instalação elétrica, tive que puxar uma fiação de mais de um quilômetro de distância. Começava em uma chácara pra lá da Avenida Tancredo Neves e tinha que trazer por trás da Igreja São Sebastião”, conta o homem que trouxe a Paranavaí os mais diversos tipos de geradores de energia. O melhor funcionou bem por apenas seis meses.

À direita, construção da primeira rádio do pioneiro (Foto: Toshikazu Takahashi)

À direita, construção da primeira rádio do pioneiro (Foto: Toshikazu Takahashi)

No Brasil da época, pouco se ouvia falar em equipamentos de qualidade. A solução era importar quase tudo, inclusive gravadores, um privilégio para poucas emissoras do Norte do Paraná. Certa vez, o pioneiro fez a transmissão de uma eleição de Mandaguari, de quem Paranavaí ainda era distrito. Na ocasião, pediu emprestado um cabo de comunicação da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP). Infelizmente, de Alto Paraná até Paranavaí não se ouvia praticamente nada por causa da chiadeira.

Ephraim Machado considera os anos 1950 e 1960 como os melhores do rádio local e regional. A justificativa é que naquele tempo o espectro não era tão carregado. “Depois de alguns anos, melhorou bem. Conseguíamos falar até com pessoas de Santa Isabel do Ivaí e Porto São José. Hoje, a rádio AM não atinge esses lugares com a mesma potência. Só se for FM. Há muita interferência de sinais de TV, comunicação amadora, etc. Não temos mais o espectro livre”, frisa. Até o final da década de 1950, pelo menos 50% da população de Paranavaí já possuía um aparelho de rádio em casa.

Para Machado, o rádio começou a se popularizar no Brasil em 1942 e só em 1954 deu um grande salto, liderando a comunicação de massa no país. A chegada da Companhia Paranaense de Energia (Copel) fez a diferença na cultura radiofônica local a partir de 1964. “Em 1962, vinha uma sobra de energia de Maringá que durava das 20h às 6h. Era limitada, mas melhor que nada”, avalia.

Rádio Cultura ainda sem a tradicional fachada nos anos 1950 (Foto: Toshikazu Takahashi)

Rádio Cultura ainda sem a tradicional fachada nos anos 1950 (Foto: Toshikazu Takahashi)

As instabilidades do rádio em Paranavaí surgiram nos anos 1970, exigindo melhores estratégias dos comunicadores e empresários para manterem-se no ramo. Ephraim Machado perseverou e ainda montou a Rádio Caiuá FM em 1980, emissora que começou a operar em 1984. Como a realidade já era bem diferente e o empresário contava com mais recursos, trouxe a Paranavaí os equipamentos mais sofisticados.

“Subia em postes, puxava fio, consertava aparelho, motor e microfone…”

O pioneiro Ephraim Machado começou a trabalhar com radiodifusão aos dez anos. A primeira função foi de trocador de discos. Anos mais tarde, quando surgiu a oportunidade de montar uma emissora, aprendeu a fazer de tudo. “Subia em postes, puxava fio, consertava aparelho, motor e microfone. Mexia no estúdio cortando som e reformava a acústica para dar mais eco. Fui até faxineiro e transportador de óleo. Minhas lembranças são boas porque passei por todos os setores”, relata o pioneiro que fazia questão de ocupar o tempo livre com trabalho.

Machado fala com preciosismo dos tempos de repórter, quando entrevistou os governadores Moisés Lupion e Bento Munhoz da Rocha Neto, além do presidente Juscelino Kubitschek. Embora só fosse para as ruas quando faltava algum repórter, o pioneiro adorava fazer entrevista política em época de eleição. Segundo Ephraim, era algo mais livre, diferente de hoje que o entrevistador precisa estar atento às exigências da justiça eleitoral.

Emissora recebeu artistas como Jorge Goulart, Nora Ney e Sivuca (Foto: Toshikazu Takahashi)

Emissora recebeu artistas como Jorge Goulart, Nora Ney e Sivuca (Foto: Toshikazu Takahashi)

“Atualmente, você corre muitos riscos quando entrevista uma autoridade política. Só tem liberdade se for falar com suspeito de crimes, daí é costumeiro o repórter fazer a típica escarrada de besteiras que vemos por aí. É triste ver como temos tanto lixo na radiodifusão brasileira”, critica o empresário que em algumas situações perdeu boas entrevistas por causa da falta de energia. Às vezes, o gravador parava de funcionar de repente.

Uma das linhas da Rádio Cultura, fundada pelo pioneiro, chegava até a sede do Atlético Clube Paranavaí (ACP), atual Praça dos Pioneiros. A fiação foi feita por Ephraim Machado que a ligava a um amplificador chamado de “maleta”, uma espécie de base do famoso microfone de fio comprimido. “Quando era ao vivo, a gente sempre preferia fazer tudo no estúdio, por questão de segurança”, pondera.

O primeiro operador de rádio amador de Paranavaí

O pioneiro Ephraim Machado foi o primeiro operador de rádio amador de Paranavaí. No final dos anos 1940, se comunicava até com pessoas do Rio Grande do Sul. Muita gente o procurava para dar recados aos parentes que viviam em outras cidades e estados. “Repassava mais notícias de falecimentos e de necessidades primárias da população. Era um serviço em prol da coletividade. Perdi as contas de quantas vezes saí de Paranavaí para levar recado em Paraíso do Norte, São João do Caiuá, Planaltina do Paraná, Amaporã, Tamboara, Alto Paraná e outras localidades”, afirma.

Machado considera o rádio amador um veículo que ajudou o interior do Brasil antes da implantação do telefone. Muitas vidas foram salvas graças ao aparelho. “Meu principal sinal vinha de uma empresa cafeeira que se comunicava com os portos de Paranaguá e Santos. Servi Paranavaí por muitos anos nessas condições”, garante. O pioneiro também se recorda de um rapaz que no final da década de 1940 trabalhava como rádio telegrafista na colônia, a serviço de uma companhia de terras.

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O valor de uma promessa

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A história do homem que viaja sete léguas com uma cruz nas costas para cumprir um voto

Zé carrega a cruz em retribuição a cura do seu burro (Foto: Reprodução)

Zé carrega a cruz em retribuição a cura do seu burro (Foto: Reprodução)

Lançado em 1962, O Pagador de Promessas, do cineasta Anselmo Duarte, é um dos maiores clássicos do cinema nacional. A obra inspirada na peça de Dias Gomes conta a história de um homem do campo que viaja sete léguas (42 quilômetros) com uma cruz nas costas para pagar uma promessa.

No filme, Zé do Burro (Leonardo Villar) chega à cidade machucado pelo peso da cruz sobre o ombro, resultado de um voto que fez à Santa Bárbara para que o seu fiel companheiro, um burro, fosse curado de uma grave enfermidade. Mas o grande problema surge quando o agricultor tenta entrar na Igreja de Santa Bárbara com a cruz, sendo impedido pelo Padre Olavo (Dionísio Azevedo) ao saber que Zé fez uma promessa à santa em um terreiro de candomblé.

Tenta justificar o episódio falando que não havia nenhuma igreja ou capela próxima. Intransigente, o sacerdote não aceita a explicação de Zé e pede que o homem saia das imediações do templo. O pagador de promessas se recusa e decide ficar na frente da igreja até conseguir entrar, honrando o compromisso feito à Santa Bárbara.

Aproveitando-se da inocência do matuto homem do campo, uma infinidade de pessoas tentam se aproximar com as mais diversas intenções. Um exemplo é o inescrupuloso personagem Bonitão, um cafetão que finge ajudar Zé apenas com a intenção de conquistar Rosa, a mulher do pagador de promessas.

Outra figura digna de destaque é o jornalista interpretado por Othon Bastos que explora com sensacionalismo e inverdades a figura de Zé como um revolucionário messiânico. A repercussão da publicação atrai visitantes, líderes religiosos, patrocinadores oportunistas e até mesmo a polícia que começa a encarar o produtor rural como um contraventor e agitador social.

Filme apresenta o contraste entre símbolos religiosos europeus e africanos (Foto: Reprodução)

Filme apresenta o contraste entre símbolos religiosos europeus e africanos (Foto: Reprodução)

É trágica e cômica a cena do comerciante estrangeiro pedindo para o fotógrafo do jornal mostrar ao fundo o seu comércio enquanto em primeiro plano aparecem Zé, a cruz e Rosa. Anselmo Duarte aborda com riqueza visual e informacional a relação conturbada entre o catolicismo e as religiões afro-brasileiras, avaliadas pelo padre como “práticas demoníacas”.

A beleza de O Pagador de Promessas está na simplicidade, objetividade e linguagem canhestra do protagonista, alheio ao materialismo e malícias da modernidade. Em alguns aspectos, o filme lembra a crítica social das fases mexicana e espanhola do cineasta Luis Buñuel e também o cinema neorrealista de Pier Paolo Pasolini, principalmente a passagem da mercantilização da fé do clássico Uccellacci e Uccellini.

O pagador de promessas ostenta valores maiores que a própria vida (Foto: Reprodução)

O pagador de promessas ostenta valores maiores que a própria vida (Foto: Reprodução)

No início da obra, símbolos religiosos europeus e africanos se misturam no mesmo ambiente, evocando uma ideia de unidade da fé sustentada em amor incondicional e livre de preconceitos. Ao mesmo tempo, a percussão arcaica e dissonante da cena introduz o espectador ao caos que ainda vai ser vivido por Zé do Burro. Outra característica marcante do filme é o contraste entre o barulho e o silêncio total, além da aridez do cenário e a fotografia angustiante que em vários momentos aspira ao desconforto e ao derrotismo.

O Pagador de Promessas é uma obra antológica que apresenta um personagem ímpar com valores maiores que a própria vida. Extremamente atual, o clássico discute assuntos ainda controversos como o preconceito religioso, reforma agrária e má distribuição de renda. O elenco conta com outros grandes nomes do cinema e da TV nacional como Glória Menezes, Geraldo Del Rey, Roberto Ferreira, Norma Bengell e Antonio Pitanga.

O filme de Anselmo Duarte foi o grande vencedor do Festival de Cannes de 1962, recebendo a Palma de Ouro, título jamais conquistado por outra película brasileira. Também foi premiado em duas categorias no San Francisco International Film Festival, onde recebeu o Golden Gate, além de outras premiações no Festival de Cartagena, na Colômbia, e uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1963.

Uma garota de programa em paradoxo

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Godard e a perspectiva humanista sobre uma personagem marginalizada

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Musa de Jean-Luc vive a prostituta Nana (Foto: Reprodução)

Vivre Sa Vie, Lançado no Brasil como Viver a Vida, é um clássico da Nouvelle Vague de 1962, do controverso cineasta francês Jean-Luc Godard. O filme conta a história de Nana, uma garota de programa que sonha em ser atriz e vive o paradoxo de preservar a própria integridade.

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Natureza de Nana revela humanismo em crise (Foto: Reprodução)

Viver a vida é protagonizado por Anna Karina que empresta beleza a personagem Nana. Por si só, o rosto angelical e expressivo da atriz propõe um paradoxo ao encarnar uma meretriz. Sem cenas tórridas de lascívia, exibicionismo, exaltação da sexualidade ou até mesmo beijos quentes, o filme é uma perspectiva humanista sobre uma personagem marginalizada. Na obra, a garota de programa assume uma notoriedade idiossincrásica em que citações literárias e filosóficas determinam o cotidiano.

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Protagonista assiste ao enlace entre a modernidade e a decadência (Foto: Reprodução)

Embora depreciada pela sociedade, Nana é uma caricatura expressionista vivendo sob um prisma de valores criados por ela mesma, totalmente desvinculada do caráter maternal imposto às mulheres. O contexto, quando imaterial, se resume a um universo reflexivo, onde a objetividade e o concreto só existem em razão da subjetividade. Tudo é transmitido no filme por etapas, já que Viver a Vida se divide em doze atos.

Do início ao fim, é permitido invadir a intimidade de Nana, representante de um ideal de liberdade que tenta ignorar tudo a sua volta. Mas nem sempre consegue. A protagonista se mostra frágil ao entregar o corpo por exigência do ofício. Sente que algum tipo de emoção e sentimento nasce ou morre antes de cada relação sexual.

O espectador, que assume os olhos de Godard, presencia muitas das cenas como testemunha; alguém o tempo todo ao alcance de Nana. A primeira cena em que a câmera, de uma posição privilegiada, destaca as costas e os ombros da personagem, mantendo o rosto oculto enquanto conversa em um café, é o exemplo primordial.

A natureza de Nana ratifica a ideia de que o humanismo está em crise há muito tempo. Como sobrevivente do submundo parisiense, ela assiste ao enlace entre a modernidade e a decadência. Na capital francesa, surgem cinemas, cafés e máquinas de fliperama enquanto morrem pessoas, sonhos e ideais.

O declínio econômico de Paranavaí

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Quando o desenvolvimento foi comprometido pela monocultura e ausência de políticas públicas

Município se tornou símbolo de progresso nos anos 1950 (Acervo: Fundação Cultural)

A história mostra que Paranavaí, na região Noroeste, poderia ser um dos municípios mais importantes do Paraná, no entanto, em função da falta de diversificação econômica e ausência de políticas públicas para o setor agrícola, a cidade entrou em declínio a partir de 1970.

Paranavaí teve um progresso exemplar até o início da década de 1960. À época, a cidade era vista como símbolo de progresso no Paraná, uma imagem que ganhou solidez em 1956, quando uma pesquisa da Associação Brasileira dos Municípios apontou Paranavaí como uma das cinco cidades com maior índice de desenvolvimento do país.

As consequências humanas

Contudo, como tinha um perfil essencialmente agrícola, baseado na monocultura cafeeira, a ex-Fazenda Brasileira experimentou um declínio sem precedentes. As primeiras geadas que castigaram as lavouras da região de Paranavaí e atingiram profundamente a economia local foram registradas em 1962 e 1964, de acordo com informações da Secretaria Nacional de Defesa Civil. “Na segunda geada, o prejuízo foi tão grande que tive que vender meu sítio. A partir do acontecido, nunca mais quis mexer com a cafeicultura”, revelou o pioneiro paranaense Orlando Otávio Bernal.

Para piorar, a intempérie voltou a devastar as propriedades do Noroeste Paranaense em 1969, destruindo pelo menos 80% da produção cafeeira regional. “Quando meu pai viu aquela camadinha fina de gelo sobre o cafezal, ele entrou em pânico. Nunca o tinha visto chorar daquele jeito, jogado sobre um pé de café. Perdemos tudo, não deu pra recuperar nada”, confidenciou o empresário Fabrício Gomes Soares. Dias depois, a mãe de Soares flagrou o pai se preparando para ingerir um rodenticida conhecido como chumbinho. Felizmente, conseguiu evitar o pior.

Em 1964, a economia local foi castigada pela geada (Acervo: Ordem do Carmo)

A mesma sorte não teve o pai da aposentada Catalina Prado Ruiz que tinha uma propriedade rural às margens da Rodovia BR-376. “Ele contraiu muitas dívidas com as geadas anteriores, então quando veio a mais forte, em 1969, não aguentou”, enfatizou Catalina com a voz calma e pausada, sem velar os olhos marejados. O homem foi encontrado morto, após um ataque cardíaco fulminante, agarrado à base de um cafeeiro.

O agricultor capixaba Orlando Brás de Mello, radicado em Paranavaí desde 1957, preferiu não citar nomes, mas contou que teve vários conhecidos que não superaram os prejuízos, se endividaram e cometeram suicídio. “Meu cunhado quase enlouqueceu. Ele pôs fogo no cafezal e num barracão enorme onde costumava estocar o café”, complementou.

As consequências econômicas

Como consequência econômica das geadas, o preço do café subiu, surgindo um ciclo de especulações que pareceu infindável. “A situação era preocupante demais, muito triste. Quase ninguém tinha ânimo pra continuar porque aqui a gente já tinha outro problema grave que era o solo empobrecido”, relatou o pioneiro cearense João Mariano, se referindo também ao surgimento das erosões hídricas que se intensificaram a partir dos anos 1960.

Com a queda da cafeicultura, que preservava um caráter familiar na região Noroeste do Paraná, houve grande abertura para a formação dos latifúndios, o que intensificou mais ainda as desigualdades sociais. Logo as lavouras começaram a ser substituídas por pastagens e, como a pecuária absorveu pouca mão de obra, milhares de trabalhadores rurais ficaram desempregados. “Que eu me lembre, quando deixei o trabalho na lavoura e não consegui nada na área urbana de Paranavaí, pelo menos da fazenda onde eu trabalhava e de outra propriedade vizinha mais de 200 pessoas foram embora pra Maringá”, disse o taxista Jurandir Romano de Paula.

Índice populacional estagnou nos anos 1970 (Acervo: Ordem do Carmo)

No Noroeste do Paraná, entre as cidades mais prejudicadas pela intempérie estavam Paranavaí, Tamboara, Paraíso do Norte, Nova Aliança do Ivaí e Mirador que em 1960 representavam 1/3 de toda a produção agrícola regional, conforme registros do extinto Instituto Brasileiro do Café (IBC). Em 1970, a região de Paranavaí somou 336 mil habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dez anos depois, em 1980, perdeu quase 50 mil habitantes, somando 288 mil moradores.

Foi um retrocesso para a região que em 1960 contou com mais de 307 mil habitantes. “Em 1970, tive que fechar minha mercearia porque fazia mais de seis meses que estava trabalhando no vermelho. Teve mês que não vendi nada porque ninguém tinha dinheiro. Nem conseguia mais honrar os compromissos com fornecedor”, destacou o ex-comerciante Geraldo Marques.

Em 1980, a produção cafeeira do Noroeste Paranaense foi quase reduzida pela metade, caindo de 30 milhões de cafeeiros para 16 milhões. O solo frágil e comprometido pela falta de técnicas adequadas de plantio, manejo e cultivo fez com que o milheiro de pés de café rendesse apenas 27 sacas, quantia muito inferior as 150 da década de 1960, revelou estatísticas do extinto IBC.

Do melhor ao pior índice de desenvolvimento

Orlando de Mello frisou que a lavoura era o “carro-chefe” da economia regional de Paranavaí, por isso, o impacto foi tão grande. “Eu mesmo não tinha nenhum conhecido, amigo ou parente que trabalhasse com outra cultura que não fosse o café”, assinalou Jurandir de Paula. A falta de diversificação econômica deu ao Noroeste Paranaense reflexos muito negativos. Nos anos 1970, a região encabeçada por Paranavaí teve os piores índices de desenvolvimento do Paraná.

Na década de 1980, a região de Paranavaí perdeu quase 50 mil habitantes (Acervo: Ordem do Carmo)

O que ilustra bem esse fato é uma pesquisa do IBGE que foi lançada em 1980 sobre industrialização e geração de empregos. A microrregião de Paranavaí ocupou a última posição, com uma ínfima contribuição estadual de 0,5% enquanto as regiões de Ponta Grossa e Londrina despontaram com 10,4% e 9,5%. “Na cidade, não tinha emprego, então a gente tinha que ir pra onde dava. Cheguei a passar uma temporada trabalhando em lavouras em Minas Gerais pra poder sobreviver. Tinha mulher e filhos pra sustentar”, argumentou o aposentado Bernardo Ricardi Proença.

Conforme a pecuária se desenvolveu, o homem se afastou cada vez mais do campo. Um estudo do escritor Paulo Marcelo Soares da Silva indicou que nos anos 1980, o gado já ocupava mais de um milhão de hectares na região de Paranavaí enquanto as lavouras mal ultrapassavam 180 mil. “Eu era acostumado a ver muitas plantações e muita gente trabalhando no campo. Isso acabou. O que a gente viu depois foi só boi e deserto”, desabafou Proença.

Paulo Marcelo apontou ausência de uma política oficial para o setor agroindustrial (Foto: Estúdio Guto Costa)

No livro “História de Paranavaí”, o escritor Paulo Marcelo levantou duas hipóteses sobre o declínio econômico de Paranavaí a partir de 1969. A primeira foi a ausência de uma política oficial para o setor agroindustrial. Já a segunda, a adoção de um sistema tributário centralizador que prejudicou os municípios da microrregião, inviabilizando o surgimento de novos incentivos fiscais.

Pesquisadores e pioneiros são unânimes em afirmar que o retrocesso de Paranavaí nos anos 1970 e 1980 teve raízes na supervalorização da monocultura. “Muita gente fez o mesmo depois com a pecuária. Mas o problema é que criar gado só beneficiou uma minoria, não teve um aspecto social, ao contrário da cafeicultura, apesar da exploração do trabalho rural ter surgido na nossa região logo nos primórdios da colonização”, avaliou o sociólogo Otávio Bernal Filho, acrescentando que os nordestinos foram os mais lesados pelas injustiças sociais que transcorriam no campo.

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Dedicação à música clássica

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Conservatório Nice Braga levou arte erudita a mais de mil pessoas durante 44 anos

Salas de onde ressoavam os pianos Essenfelder e Schwartzmann (Crédito: David Arioch)

É impossível falar de música erudita em Paranavaí sem citar o saudoso Conservatório Nice Braga. Com uma história de 44 anos, a escola que encerrou atividades no final de 2006 formou mais de mil alunos em piano clássico. E mais, se tornou referência no Noroeste do Paraná, principalmente por usar as metodologias dos conservatórios europeus.

Em 1962, o professor Arnoldo Poll entrou em contato com a Prefeitura de Paranavaí e solicitou um terreno para a implantação de uma escola de música. No mesmo ano, o pedido foi atendido e a construção foi concluída em pouco tempo, graças ao empenho da comunidade que trabalhou sem cobrar nada. Assim surgiu o Conservatório Nice Braga que recebeu tal nome em homenagem a mulher do então governador Ney Braga.

Alguns anos depois, ainda na década de 1960, o professor vendeu o conservatório, a título de direito, para Luzia Guina Machado, também falecida, que administrou a escola durante 38 anos, segundo o ex-auxiliar administrativo do Conservatório Nice Braga, Israel Rodrigues, que entrou na escola de música em 1984 para estudar órgão. “A Luzia me convidou para ajudá-la na administração por dez dias. O tempo passou e fiquei 22 anos”, reitera Israel sorrindo.

Entre 1962 e 2003, sob dedos habilidosos os pianos ressoavam pelas imediações da escola de música, fazendo os transeuntes se sentirem imersos em um universo de beleza e sensibilidade. “Não conhecia música clássica, mas sempre que passava lá em frente ficava encantada”, relata a dona de casa Roberta Castelo. As releituras no conservatório incluíam composições como as clássicas sonatas de Beethoven e o primitivismo de Bartók.

Até o final da década de 1990, foram realizados muitos concursos no auditório da escola, segundo a professora de música Neuza Diogo que se matriculou no Conservatório Nice Braga com o objetivo de concluir o curso de piano clássico iniciado em São Paulo. “Em 1962, eu estava no sétimo ano fundamental e quando terminei me convidaram para dar aula”, lembra. O que começou como uma atividade remunerada casual durou 35 anos.

À época, quatro professores lecionavam na escola de música, mas logo foram contratados mais quatro. Segundo Neuza, a procura pelo curso de piano clássico era tão grande que o interessado tinha de reservar uma vaga em novembro para começar a estudar em janeiro. “Pra você ter uma ideia, só eu como professora assinei mais de 800 diplomas de alunos que concluíram estudos de piano. Em Paranavaí, a maioria dos conservatórios que vieram depois foram fundados por professoras que foram minhas alunas”, frisa.

A escola não era referência apenas para a população local. Professores de música de Nova Londrina, Loanda, Querência do Norte, Paraíso do Norte, Terra Rica, Alto Paraná, Nova Esperança, Nova Aliança do Ivaí e muitas outras cidades se formaram no Nice Braga. A qualificação profissional sempre foi o maior objetivo do conservatório que foi comparado às escolas de música da Europa.”Lembro da carta de uma aluna que se mudou para a Alemanha. Ela nos parabenizou pelo curso porque a nossa grade curricular é compatível com a deles. Houve o caso de um rapaz também que vive na Inglaterra e falou a mesma coisa”, enfatiza Rodrigues.

A professora Neuza Diogo admite ser impossível mensurar com precisão o total de alunos que passaram pelo conservatório. “Foram muitos, provavelmente mais de mil. Mas o auge, sem dúvidas, foi em 1968, quando tínhamos mais de 200 alunos. Dávamos aulas de piano, teclado, órgão, violão, violino, balé e jazz”, pontua.

O Silêncio do Nice Braga

Em 2006, o Conservatório Nice Braga perdeu a magia de outros tempos. Com apenas oito alunos matriculados, a impossibilidade de manter a escola aberta crescia a cada dia. Em um passeio pelas pequenas salas do conservatório, tornou-se comum encontrar os belos e bem conservados pianos Essenfelder e Schwartzmann, que antes pareciam ter vida própria e emocionavam os passantes, aposentados, relegados ao ostracismo. Lá fora, até mesmo vizinhos estranharam o silêncio.

O auxiliar-administrativo do Conservatório Nice Braga, Israel Rodrigues, diz acreditar que tudo foi uma consequência natural do desinteresse pela música clássica. Para ele, era como se as pessoas tivessem um bloqueio em relação ao erudito. “Se divulgar que teremos uma audição do gênero, acredite, apenas estudantes de música vão participar. Os demais não se importam”, lamenta. Opinião também dividida pela professora de música Neuza Diogo. “Hoje em dia, os alunos querem apenas o popular”, frisa.

Espaço agora abriga Escola Municipal de Música Luzia Guina Machado (Crédito: David Arioch)

Espaço agora abriga Escola Municipal de Música Luzia Guina Machado (Crédito: David Arioch)

Os primeiros sinais de mudanças surgiram na década de 1990, e dez anos depois as dificuldades aumentaram. Segundo Rodrigues, não sobrava mais dinheiro para suprir despesas com manutenção, limpeza e jardinagem. Até 2003, a situação foi contida porque os gastos eram proporcionais ao número de aprendizes. “Até o último momento, tínhamos oito alunos. Mas a situação já era insustentável e o jeito foi fechar a escola”, destaca.

Com o fechamento do Conservatório Nice Braga, o município reassumiu a propriedade e repassou R$ 12 mil aos familiares da ex-diretora Luzia Guina Machado pela realização de benfeitorias ao longo de décadas. Mantido pela Fundação Cultural, hoje o espaço é sede da Escola Municipal de Música Luzia Guina Machado, onde dezenas de crianças e adolescentes participam gratuitamente de oficinas de música. Além disso, as características originais do imóvel foram mantidas, preservando a história do conservatório.

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O empacotador que virou ícone do rádio

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Armando Trindade se apaixonou pelo rádio na mocidade, um casamento que durou 47 anos

Armando Trindade começou a trajetória no rádio em 1957 (Foto: Acervo Familiar)

Armando Trindade começou a trajetória no rádio em 1957 (Foto: Acervo Familiar)

No limiar da adolescência, Armando Trindade Fonseca descobriu o amor pelo rádio. Foi discotecário, sonoplasta, apresentador de programas de auditório e jornalista esportivo e investigativo – a grande paixão do homem que dedicou 47 anos ao rádio. Em 2005, apenas a morte conseguiu interromper a trajetória do radialista que parecia carregar o coração no topo do microfone.

A história de Armando Trindade Fonseca com o rádio começou há mais de 50 anos, quando sua mãe era faxineira da Rádio Paranavaí. “Era julho de 1957, e eu tinha perdido o emprego como empacotador. Minha sorte foi que me convidaram para ser discotecário. Pouco tempo depois, me tornei sonoplasta. Era um trabalho difícil. Eu tinha 14 anos e precisava ficar atento ao locutor o tempo todo”, relatou emocionado.

Em três meses, Armando Trindade se tornou referência em sonoplastia. A facilidade em aprender e o amor precoce pela profissão o estimulava a chegar às 5h30 na Rádio Paranavaí. “Saia de lá só meia-noite. Isso porque exigiam pouco de mim. Curioso como eu era, quis aprender tudo, principalmente a trabalhar com programa de auditório. Ainda assim, continuava na discoteca e na sonoplastia, meu forte”, afirmou.

A primeira oportunidade de entrar no ar surgiu pouco tempo depois, em uma segunda-feira. Encarregado da sonoplastia de uma peça teatral radiofônica do autor Jackson Frazzoni, Fonseca foi convocado a substituir um ator que na última hora desistiu de participar. “O rapaz ficou com medo porque o papel dele era de uma bichinha. Então me chamaram e eu aceitei. Depois que acabou a peça começaram a me chamar de bichinha”, lembrou, às gargalhadas.

Em 1962, Fonseca foi chamado para substituir o apresentador Neideval Oliveira Guimarães que comandava um programa infantil. “Fiz isso durante 12 anos, sempre me espelhando em outros programas, como do César Alencar, da Rádio Nacional. Na época, eu gostava mais de trabalhar com as crianças. Com o tempo, adquiri gosto pelas notícias, independente do tema ou do assunto”, justificou.

Armando, que acompanhava a transmissão das rádios de São Paulo e do Rio de Janeiro, sempre ouvia reportagens policiais, mas tinha receio de trilhar tal caminho. “Um dia, em 1963, decidi pegar o gravador e fui atrás da notícia. Gostei do negócio, tanto que de 10 minutos para reportagens locais, aumentamos para 15. Com o tempo, consegui 25 minutos em produção local, deixando só 15 para notícias estaduais e nacionais. Virou um radiojornal diário, de segunda a sábado”, explicou.

Radialista entrevistando o atual senador Álvaro Dias

Fonseca entrevistando o ex-governador Álvaro Dias (Foto: Acervo Pessoal)

No auge da profissão, o radialista trabalhava em torno de 14 horas por dia. Não havia horário específico de entrada e saída na emissora. Sempre levantava às 5h e era questionado pela mãe. “Queria saber pra onde eu ia. Sempre respondia que quando quisesse me encontrar era só ligar na emissora. Comecei, aprendi e me estabeleci no rádio. É o que faço há 47 anos”, revelou com olhos marejados.

Mesmo com graves problemas renais, no último ano de vida, Armando Trindade Fonseca travava uma luta diária consigo mesmo para não se distanciar do rádio. Fazia hemodiálise às 4h30, três vezes por semana e, com dedicação e esforço inigualáveis, procurava notícias, lia jornais e ia para a emissora às 12h, encerrando o expediente às 14h. O radialista faleceu no dia 12 de julho de 2005 e marcou para sempre a história do rádio em Paranavaí, com um exemplo de perseverança tão raro que hoje em dia é mais fácil ser encontrado no cinema do que na realidade.

Radialista era ameaçado

O radialista Armando Trindade Fonseca foi ameaçado muitas vezes. Em 1980, Fonseca estava em uma reunião da Câmara de Vereadores, trabalhando para a Rádio Cultura, quando lhe disseram que havia uma pessoa lá fora, com um fuzil, o esperando para matá-lo. “Um rapaz da rádio disse que eu estava na Câmara. O indivíduo achou que ele estava mentindo e chutou a porta que acabou quebrando. Aí o sujeito passou pela minha casa e não tinha ninguém. Minha mulher estava no hospital porque tinha ganhado bebê”, lembrou.

Mesmo ciente da situação, Armando Trindade continuou agindo com naturalidade. “Saí na rua de peito aberto. Cheguei ao trabalho e coloquei a reportagem esportiva no ar. Em seguida, o telefone tocou. Quando atendi, era o indivíduo falando que iria me matar. Falei pra ele que quem quer matar não fala. Vem quietinho, mata e depois vai embora”, declarou. O radialista desligou o telefone e nunca mais foi perturbado pelo homem. “Houve muitas outras ameaças, de políticos mesmo, só que ninguém me intimidava não”, garantiu.

Auge das reportagens esportivas

Sem pestanejar, o radialista Armando Trindade Fonseca afirmou que o auge das reportagens esportivas em Paranavaí foi na década de 1970, quando a cidade tinha um grande time de futebol e os melhores jogos. “O Estádio Natal Francisco lotava. Lembro das arquibancadas de madeira como se fosse hoje. Eu corria pra lá e pra cá naquele sol quente para fazer a cobertura”, frisou.

Quando os jogos ocorriam em outras cidades, Armando Trindade sempre se apressava. Ia para Curitiba, Cambará, Jacarezinho, Santo Antônio da Platina, Londrina, Paranaguá e muitos outros municípios. “As cidades do Oeste do Paraná ainda não tinham times. Os clubes de Toledo, Cascavel, Pato Branco e Clevelândia surgiram bem mais tarde. Eu sempre viajava aos domingos quando os jogos eram fora. Saía de madrugada e voltava no dia seguinte por volta das quatro, cinco horas da manhã”, exemplifica. As transmissões eram feitas ao vivo, um trabalho complicado porque ainda não existiam as micro-ondas. “Era tudo linha física, o que fazia a transmissão atrasar alguns segundos, atrapalhando o locutor”, revelou o radialista.

Frases do radialista Armando Trindade Fonseca

Já fui ameaçado sim, mas quem ameaça não faz. Cão que ladra não morde.”

“Me recordo quando eu ficava atrás da casa brincando, pegava uma latinha e fazia de conta que era o microfone e que havia um auditório.”

“A gente sempre acha alguém que gosta de trabalhar com rádio. Na Rádio Cultura mesmo sempre teve uns três, quatro que trabalhavam porque gostavam. Mas é claro que tem aqueles que fazem porque querem aparecer.”

“Para alguns, o rádio é como se fosse uma obrigação. Para outros, o motivo são as meninas, principalmente porque no rádio dá mulher pra arrebentar. O cara começou a aparecer um pouquinho as mulheres invadem.”

“Programa de auditório era gostoso. Antigamente o público fazia muito barulho. O locutor pedia para fazer silêncio e gritavam mesmo assim. Daí havia essa briga, no bom sentido. Eu falava “silêncio” e o público gritava. Às vezes, vaiava. Era bem diferente do que eu queria, eles faziam exatamente o contrário, mas mesmo assim era muito agradável.”

“O jornalismo representa muito na minha vida. Tenho três filhas e nenhuma quis seguir o rádio, nem fazer jornalismo. Eu queria que pelo menos uma delas seguisse isso, mas nem a caçula quis. Ela escolheu fazer educação física, a do meio preferiu direito e a mais velha optou por biologia.”

Considerações

Em 2004, tive a oportunidade de entrevistar o radialista Armando Trindade Fonseca que, mesmo combalido por problemas de saúde, me relatou toda a sua trajetória em prol da cultura radiofônica local. A entrevista lapidada resultou no material acima que figura como uma homenagem póstuma.